Revistas, sites e seções jornalísticas especializados em literatura costumam fazer levantamentos entre os leitores para eleger os melhores começos de histórias de ficção. Os campeões de audiência se repetem – e, na maioria das vezes, concordo com as indicações. Como questionar, por exemplo, que García Márquez seja um dos preferidos com o seu Cem Anos de Solidão? Basta a frase inicial para atiçar todas as curiosidades.
"Muitos anos depois, diante do pelotão de fuzilamento, o Coronel Aureliano Buendía havia de recordar aquela tarde remota em que seu pai o levou para conhecer o gelo."
Também é inquestionável a maestria de Franz Kafka, em A Metamorfose:
"Quando certa manhã Gregor Samsa acordou de sonhos intranquilos, encontrou-se em sua cama metamorfoseado num inseto monstruoso."
Quem não segue adiante depois de ler um início desses merece mesmo virar barata.
E a filosófica e imbatível primeira frase de Anna Kariênina, de Tolstói?
"Todas as famílias felizes se parecem, cada família infeliz é infeliz à sua maneira."
Tudo bem, ele não conheceu o Instagram, onde as famílias parecem ser felizes o tempo todo, mas sua frase é tão certeira que mesmo essas devem ficar em dúvida.
Cervantes foi ainda mais provocador no seu Dom Quixote:
"Desocupado leitor: sem juramento meu embora, poderás acreditar que eu gostaria que este livro, como filho da razão, fosse o mais formoso, o mais primoroso e o mais judicioso e agudo que se pudesse imaginar."
Pois bem, esses escritores clássicos e históricos, gênios da arte de juntar letrinhas, acabam de ser superados por um bebê que mal sabe pronunciar as palavras. Minto: por um bebê que sabe pronunciar muito bem as palavras, mesmo as mais intrincadas. Esse, sim, é um campeão de audiência das redes sociais, graças aos vídeos enternecedores que sua mãe divulga. Pois o bebê das palavras difíceis, a menina Alice, filha da fotógrafa gaúcha Morgana Secco e do engenheiro Luiz Gustavo Schiller, talvez tenha produzido o melhor início de história e o mais oportuno para a celebração do próximo domingo:
"Era uma vez um papai chamado papai."