Cada vez que ocorre um vendaval, como o que destruiu casas, derrubou árvores e postes, feriu pessoas e provocou uma morte em São Francisco de Paula, no último domingo, me lembro da célebre definição do arquiteto Oscar Niemeyer para a existência humana.
– A vida é um sopro – disse o homem que construiu Brasília e que morreu 10 dias antes de completar 105 anos.
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Mesmo tendo sido um fenômeno de longevidade, pois chegou ao centenário lúcido e produtivo, Niemeyer se manteve convicto sobre a brevidade da vida. E também sobre a perenidade da fama. Quando foi questionado sobre como gostaria de ser lembrado, o arquiteto disse com simplicidade:
– Como um ser humano que passou pela Terra como todos os outros – que nasceu, viveu, amou, brincou, morreu, pronto, acabou!
Um sopro, portanto. Pleno de movimentos, sentimentos, amores e dores, mas um pequeno sopro no ciclo imensurável do universo. Todos somos apenas isso, ainda que muitas vezes, pretensiosamente, almejemos ser muito mais. Até que a natureza, sábia e impiedosa, nos reduz à nossa insignificância, com alguns instantes de tempestade.
Pablo Neruda criou uma ode maravilhosa para as tormentas que nos atormentam. Começa assim: "Anoche vino ella, rabiosa, azul, color de noche, roja, color de vino, la tempestad trajo su cabellera de agua, ojos de frío fuego, anoche quiso dormir sobre la tierra". Quando ela chega assim, mal-humorada, nós é que não dormimos mais.
Mas o sopro que destrói também constrói. Os ventos que uniram continentes empurrando as velas das caravelas pelos caminhos inexistentes do mar salgado também mereceram poemas, como este do grande Fernando Pessoa: "Às vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido".
Tudo vale a pena, lembrou o mesmo poeta, quando a alma não é pequena. A alma – essa misteriosa tempestade que nos habita, às vezes brisa, às vezes furacão – também seria resultado de um sopro tão poderoso, que talvez a tenha tornado eterna. Talvez?
Pronto, acabou!