Mesmo em um país com juro (13,75%) e inflação (4,18%) altos, como o Brasil, fica evidente o tamanho do desespero embutido no plano argentino anunciado no domingo (15) para tentar estabilizar a moeda nacional.
A manobra mais dramática é elevar a taxa básica em 600 pontos básicos - ou seis percentuais - para 97% ao ano - sim, sete vezes maior do que a do Brasil. Mas é bom relacionar os números: mesmo com essa alta drástica, o juro real na Argentina ainda é negativo, porque a inflação acumulada em 12 meses acabou de subir para 108%, depois que os preços decolaram 8,4% só nos 30 dias de abril, muito acima das expectativas mais pessimistas.
Então, drama 1: a inflação subiu em um mês, na Argentina, o dobro do que subiu no Brasil nos últimos 12. Drama 2: aqui, o juro real é de quase 7%, enquanto segue negativo no vizinho problemático - que precisa atrair ou ao menos reter algum capital em pesos, porque as reservas do Banco Central de La República Argentina (BCRA) também já estão no negativo.
Como assim? Conforme a consultoria 1816 Economia & Estrategia, de Buenos Aires, a seca histórica que derrubou as exportações de soja do país - e, em consequência, a entrada de dólares - faz com que o país esteja com todas as reservas comprometidas, mais um excedente de US$ 1 bilhão - comprometidas com pagamentos devidos. Ou seja, as reservas líquidas também estariam no negativo.
Mesmo assim, um dos anúncios feitos na véspera pelo ministro da Economia, Sergio Massa, é de que o BCRA vai aumentar suas intervenções no mercado de câmbio para tentar frear a queda do peso. Ou seja, a tal da "autoridade monetária" tentará disciplinar um dos sistemas de câmbio mais emaranhados do planeta - existem quase duas dezenas de cotações diferentes , do dólar Catar ao Coldplay - com quase nada nos cofres. A cada novo sinal da evidente debilidade da moeda nacional, crescem as apostas dos argentinos - traumatizados por devaluaciones e corralitos - no acúmulo de dólares.
Essa situação motivou a recente visita do presidente da Argentina, Alberto Fernández, ao Brasil. Veio e voltou apenas com uma vaga promessa de financiamento às exportações que, do ponto de vista dos vendedores brasileiros, é desnecessária. Com a China, as negociações em yuans têm crescido. A última esperança dos hermanos é negociar algum repasse do Fundo Monetário Internacional (FMI) para irrigar a aridez de verdinhas. Mas o peso murcha a olhos vistos, e não se sabe se poderá ter mesmo capacidade de recuperação.