No mestrado em Economia feito na Universidade de São Paulo depois da graduação em Administração pela Fundação Getulio Vargas, Alexandre Schwartsman foi colega do futuro ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Em um vídeo que circula nas redes sociais há alguns anos, Haddad brinca que colou de Schwartsman, ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central (BC) e de Naércio Menezes, economista especializado em Capital Humano e Desigualdade. Só que muita gente levou a sério e agora aponta o episódio como "confissão". Crítico ácido das primeiras sinalizações do ex-colega no Ministério da Fazenda, Schwartsman faz questão de repor a verdade: não houve cola, nem faria sentido, porque mestrado não é baseado apenas em testes, mas em aprendizado obtido em pesquisa e compartilhamento de conhecimento.
Ter ministro definido ajuda?
Ajuda para ter alguém de quem reclamar. No caso do indicado, a verdade é que, embora não se possa dizer que será a rainha da Inglaterra, vai atuar como manifestação do consenso da liderança petista. Vai fazer aquilo que o partido, o círculo mais próximo de Lula, definir que vai fazer. O maior sintoma disso é que o grupo de Economia da transição não foi ouvido para ver qual seria o tamanho do waiver fiscal (a "licença para gastar" prevista na PEC da Transição aprovada no Senado).
Sobre Haddad, uma brincadeira feita por ele sobre ter "colado" de você e de Naércio Menezes parecer ter sido levada a sério. Ou é verdade?
Não, isso foi uma brincadeira. Fernando não colou de mim no mestrado. Acho que ele havia acabado de entrar no Insper (como professor), não lembro bem o contexto, achou que eu e o Naná estivéssemos na plateia e fez essa piada. Era um grupo pequeno, muito próximo, estudávamos muitas coisas juntos. Não existe essa história de ele colar de mim, até porque não existe um momento no mestrado que faça sentido "colar". Foi uma brincadeira, sem qualquer base na realidade.
Você diz que Haddad será um ministro de um grupo, mas a ideia não era um governo de uma frente?
Esse negócio de frente é uma bobagem. Não tem frente nenhuma. Para existir, precisaria ter estabelecido um objetivo comum. A única coisa que todos queriam era derrotar Bolsonaro. Não foi e não será uma frente.
E que política petista será essa?
O que estamos vendo é a reedição da Nova Matriz Econômica (que marcou parte do segundo mandato de Lula e os de Dilma Rousseff). Muitas coisas são difíceis, mas essa caracterização, não. Há uma baita expansão fiscal, permeada pela ideia de que gasto público é vida. Já há manifestações de como engajar o BNDES na história. Todas as manifestações até agora apontam para uma nova matriz 2.0, ou 2.023.
Uma das teses também é a de que a PEC não representaria expansão fiscal, porque recomporia em 2023 e 2024 o volume de gastos em relação ao PIB de 2022. Não está correta?
Se estivesse, estaria passando uma PEC de R$ 70 bilhões, mais do que suficiente. É uma tese equivocada, inclusive porque fazem a conta com um PIB mais alto do que vamos enfrentar. Além disso, do ponto de vista do controle da inflação, o Banco Central (BC) estava contando com alguma contração fiscal (menos gastos). Então, é expansão fiscal em relação ao que o BC estava projetando. Temos uma economia com problema inflacionário. O BC não está tentando reduzir a atividade à toa. Tenta reduzir porque tem problema de inflação. Aí vem a política fiscal atuam em sentido contrário.
Diante da situação do orçamento de 2023, não era necessária uma recomposição?
Depende para quê. Se fosse única e exclusivamente para manter o Bolsa Família em R$ 600, bastariam R$ 70 bilhões. Como é possível que o Brasil gaste 20% do PIB e falta dinheiro? Falta vontade de ligar com outros problemas. Não posso imaginar que todo esse gasto seja útil e eficitente. A proposta tem objetivos meritórios, ninguém é contra cuidar dos pobres. Mas o Brasil precisa aprender a cuidar melhor do dinheiro. Quanto colocou? Qual o resultado? Não se mede isso. A expansão fiscal pode ser a mais meritória do mundo, mas significa que, tudo o mais mantido, vai virar mais juro ou mais inflação.
Muitos economistas veem necessidade de reduzir desonerações tributárias, mas há barreiras políticas para avançar nessa área, não?
Sem dúvida, há vários desonerações, como Simples e Zona Franca de Manaus. Em outro contexto, o Doria (ex-governador de São Paulo) ensaiou retirar isenções e quase houve uma revolução, chamaram de impostaço. E é bom lembrar que boa parte dessas isenções, não todas, claro, veio do período do Mantega. Mas é preciso reavaliar desonerações, ver se vale a pena, se não vale. Precisa fazer a conta, quanto se deixa de arrecadar, quanto teve de retorno. Até agora não teve. E acredito que não terá.
Com a Fazenda definida, o que se espera para o Planejamento e a Indústria e Comércio, há chance de um nome mais comprometido com responsabilidade fiscal?
Alguns dos citados já disseram que não iriam, porque não teriam espaço para suas ideias. Mas deixa o mercado sonhar. Nesse momento, é melhor esquecer a bolsa. O foco tem de ser no juro futuro. É um mercado maior do que o da bolsa e reflete muito mais a preocupação macro. Na bolsa, pode estar ruim aqui, mas se as commodities (matérias-primas básicas) sobem, já vai junto. O mercado de juro projetava queda da Selic na segunda metade de 2023, porque os contratos de seis a 12 meses estava muito abaixo dos de zero a seis. A ideia era de que ia se manter a taxa de 13,75% até maio ou junho, depois ia cair. E não se alterou depois da eleição, mas depois da frase de Lula sobre o mercado. Agora, o juro de seis a 12 meses está igual ou maior do que o de zero a seis.