Mesmo depois de ver parlamentares distribuindo maços de reais pela roupa e assessor presidencial correndo com uma mala recheada de cédulas, até os brasileiros mais calejados com escândalos se constrangeram com a imagem de caixas e malas abarrotadas de notas encontradas em um imóvel que seria usado pelo ex-ministro Geddel Vieira Lima.
O que mais choca é o que não aparece na fotografia: a desfaçatez. O depósito de recursos ilícitos – ninguém manteria daquela forma valores obtidos de forma honesta – foi descoberto depois de três anos de investigações sobre propinas e desvios. É um desafio a qualquer vestígio de constrangimento por parte de quem o mantinha lá. Para os demais, é fonte de vergonha por ser um retrato do alcance das distorções do país.
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É o dinheiro que falta na prestação adequada de serviços públicos, nos investimentos em infraestrutura, no apoio ao desenvolvimento econômico e social, no estímulo à produção científica e cultural.
Nem a bolsa de valores, que fazia dinheiro virtual com as perspectivas de enfraquecimento da delação da JBS, conseguiu manter a forte alta com que abriu os negócios. Pela manhã, predominou o diagnóstico de que a investigação sobre as circunstâncias do fechamento do acordo seria uma "flechada no pé" de Rodrigo Janot, referência à frase usada pelo procurador-geral em julho – "enquanto houver bambu, vai ter flecha". O mercado financeiro não tem preconceito sobre a origem do dinheiro. Mas sabe avaliar, se não em palavras, em dígitos, os efeitos de uma imagem poderosa.
Se tivesse mantido o ritmo da manhã, a bolsa encontraria seu recorde em pontos, passando de 73 mil. Ficaria para a história a associação com o dia da imagem vergonhosa. Em vez do sinal de retomada, prevaleceria o constrangimento de um país com líderes que não conhecem limites nem reconhecem lei. No momento em que o Brasil volta a testar vida normal na economia, enterrando a recessão, precisa deixar no fundo do poço as ferramentas que ajudaram a cavá-lo.