Criador da Easy Taxi, negócio que vendeu em 2015 e hoje está em mais de 170 países, o empresário Tallis Gomes, de apenas 30 anos, vem a Porto Alegre na próxima quarta-feira (2). Vai falar sobre sua experiência empreendedora em um seminário sobre tecnologia e inovação, promovido pelo Grupo de Líderes Empresariais (Lide) no Rio Grande do Sul. À coluna, Gomes contou sobre sua nova aposta, o aplicativo de serviços de beleza Singu, e o que fazer para uma ideia dar certo – pontos que também aborda em um livro que está lançando.
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Como tem sido o desempenho da Singu?
A Singu atende hoje quase 8 mil pessoas por mês. Funciona no Rio e em São Paulo, quase 40% do mercado nacional da indústria de beleza. Cresceu quase quatro vezes mais do que a Easy no mesmo período. Então, não poderia estar mais feliz. Focar em Rio e São Paulo foi pela concentração de mercado. Porto Alegre está no mapa. Mas talvez a gente chegue em outro país antes.
Mas Porto Alegre ainda em 2017?
Não, 2018. Para 2017, estamos bem focados em Rio e São Paulo, mercados que têm muito a crescer ainda. Não pegamos nem 0,01% do mercado ainda. Temos que nos concentrar bem para não queimar muito caixa, expandir demais e depois ter dificuldades de recapitalizar a companhia.
E em outros países, quais e a partir de quando?
Estamos olhando aqui no continente. Devemos fazer a expansão para a metade do ano que vem.
Por que você acha que o app deu certo nessa área de beleza feminina?
Muitos fatores. Com a Singu, a gente propõe a economizar o bem mais valioso, o tempo. Não precisa se deslocar para salão de beleza, spa. Levamos o salão de beleza, o spa, onde (a cliente) estiver. Faz muito sentido na vida das pessoas. É muito prático. Todo dia, às 8h ou às 22h, pode marcar o serviço, pedir o que quiser, e em duas horas vai estar na sua casa. É algo que ninguém consegue atender. Os serviços do Singu custam, às vezes, menos de 50% dos preços médios de salões ou spa. É prático, com preço acessível. O negócio é modelado para ser muito bom para os dois lados. O salão geralmente tira 70% dos profissionais de beleza, e a gente faz o contrário, pega 30% e deixa 70% com ele.
Já pensa em partir para outra ideia?
Não, o empreendedor que tem propósito e é apaixonado por aquilo que faz dificilmente tem um negócio pensando em vender. Cria pensando em carregar esse negócio, quem sabe fazer um IPO ali pra frente, mas a vida direciona o que vai acontecer. No caso da Easy Taxi, eu falo sobre isso no livro Nada Easy, que estou lançando agora, a gente precisou vender. A gente captou muito dinheiro, US$ 85 milhões, levamos o negócio para o mundo inteiro, e aí ficou muito diluído. Com o tamanho da diluição que estava, falei: "Bom, o melhor que a gente tem para fazer agora é vender a companhia, senão daqui a pouco a gente não vai tirar dinheiro do negócio". É um mercado com um buraco sem fundo, esse de aplicativos. O caso do Singu é diferente, a gente é majoritariamente dono da empresa e dificilmente vai deixar de ser no médio prazo, porque a gente começou com capital próprio, pegamos pouco dinheiro para o tamanho do negócio. Quando eu fundei a Easy Taxi tinha 24 anos, a Singu fundei com 29.
Devido à crise, muita gente perdeu o emprego e foi empreender. O que fazer para dar certo?
Eu comecei com dificuldade, também, lá no interior de Minas, com 14 anos, vindo de uma família extremamente pobre. Meu pai é militar, e minha mãe, cabeleireira. A nossa sorte é a gente que constrói, sou a prova viva disso. O que a pessoa precisa fazer é se capacitar, não tenho a menor dúvida de que o caminho é o conhecimento. A grande dificuldade, no meu tempo, é que não tinha acesso ao conhecimento da forma como hoje. Hoje em dia, qualquer Google vale tanto quanto um MBA em Harvard. Se você sabe pesquisar o conteúdo, o conteúdo do MBA em Harvard está todo disperso ali na internet. Você tem que ter a diligência de estudar e procurar esse conteúdo, que é complexo. Mas, usando esse exemplo esdrúxulo de MBA em Harvard, você pode entrar no programa do curso, baixa o conteúdo, e pode seguir o curso. Claro, tendo não o mesmo nível de conhecimento que um aluno de Harvard teria, mas com acesso ao mesmo material, isso com certeza teria. Então, essas pessoas precisam se capacitar.
Por que os negócios falham?
A maior parte, por problemas societários ou falta de conhecimento. O conhecimento é, sem dúvida alguma, a ponte que separa o empreendedor do sonho dele. Precisa ter o conhecimento para executar a ideia, mas de nada adianta o conhecimento se não existir execução. Meu avô dizia que ideia vale 10 centavos a bacia, e aí como executar é o mais difícil. Você vê pessoas que não são graduadas em boas faculdades, ou nem tem faculdade, como é meu caso, se dando bem na vida, conseguindo fazer grandes coisas. E por que isso acontece? Porque, na verdade, a grande experiência vem da execução. É a diligência, a resiliência, principalmente fazer muito bem aquilo que pede para ser feito, escolher suas batalhas muito bem, e batalhá-las como se fosse a última de sua vida são mantras de um bom empreendedor. No meu livro, falo de cada fase que vivi como empreendedor, claro que muito sobre a época do Easy Taxi, mas também sobre o Singu, meu novo momento, sobre o que estou aplicando, quais foram meus erros, e dou ferramentas práticas que vão guiando o empreendedor em cima do caminho que ele está vivendo, porque eu já passei por quase todas as fases de um empreendedor.
Mesmo fora do negócio, como viu a fusão da Easy com a Cabify?
A Cabify comprou a Easy Taxi e foi uma das duas ou três maiores aquisições da história do país. Foi um negócio de centenas de milhões de dólares, mas a gente não pode revelar o valor. Foi gigante a compra. Vejo com bons olhos, o negócio se pagou, e muitos investidores fizeram grandes fortunas com isso. Eu e meus sócios podemos também fazer uma realização financeira importante para dar mais gás aos nossos sonhos. Mas vejo que o mercado está caminhando para algo bem parecido com o que aconteceu na China, uma briga de foice em que todos saem perdendo. Ninguém está pensando em gerar dinheiro, mas simplesmente queimar dinheiro para ficar em uma briga de quem vai ganhar de quem. Isso é muito ruim para o mercado, é um buraco sem fundo.
Mas qual o sentido que você vê na fusão? Com os aplicativos, parece que os táxis estavam perdendo um pouco de espaço.
Não posso falar abertamente sobre isso. O que pode ser falado é que o objetivo é se fortalecer diante dessa guerra entre os aplicativos, que está começando agora. Quando você junta duas grandes empresas, como a Easy, líder em vários países aqui na América Latina, e a Cabify, que é extremamente capitalizada, tem um excelente produto e uma boa gestão, você se fortalece para essa guerra. O sentido é unir forças para se preparar para a guerra.
Como essa fusão vai ser percebida pelos usuários? Haverá algum benefício compartilhado?
Acho que para o usuário não deve mudar muita coisa. Vai ser transferido em forma de voucher, promoção, não muito mais do que isso.
E o que você pode falar sobre seu livro?
Dediquei seis meses da minha vida a ele. É importante dizer que a forma com que eu construí esse livro foi a forma como ele foi escrito. O que eu quero dizer com isso? Eu tinha uma série de hipóteses, que eu assumi que os empreendedores precisavam saber determinados conteúdos. Eles foram sendo validados a partir calls mensais com empreendedores através de uma grande rede chamada StartSe. Em cada capítulo eu tive um call abordando um assunto do capítulo, porque eu tinha uma ideia do que queria escrever. Então eu via as principais dúvidas desses empreendedores, somava o que eu queria escrever e escrevia o capítulo com base nas necessidades que surgiam durante esses calls. Foi muito importante, porque o livro é "faseado": os primeiros três capítulos são para o cara que está começando, os próximos três para o cara que está crescendo, precisa levantar capital, como construir o time dele, e os três últimos para quem já está gigante. O livro foi arquitetado para atender a uma necessidade. Recebo centenas de mensagens por dia nas minhas redes pedindo uma mentoria, uma ajuda e, obviamente, não consigo responder todo mundo, nem 10% disso. Escrevi o livro porque agora tenho uma resposta para todo mundo, repassando tudo que eu acho importante para um empreendedor saber em cada fase do negócio.