Se ainda havia dúvida, a ata da reunião da semana passada do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) a desfez. O nível de atividade – não apenas o da inflação – foi citado antes e em detalhe para justificar o corte de 0,75 ponto percentual no juro básico. Sem barulho, sem protestos e sem polêmica, o BC enterrou seu mandato único ao confirmar o tom do comunicado do dia 11: "o comitê avaliou que as condições para reduzir a taxa básica de juros para 13% já nesta reunião estavam presentes em função do processo de desinflação mais disseminada e atividade econômica aquém do esperado".
O rumo da prosa do BC, que mencionou "inflação marginalmente abaixo da meta" em 2017 – 4% no cenário de referência –, reforçou as apostas de um novo corte de ao menos 0,75 ponto percentual no dia 22 de fevereiro. Claro, se nada dramático ocorrer nos primeiros dias da gestão Trump. É bom lembrar que o poder do verbo do homem do topete não é pequeno: provocou perdas milionárias em ações de montadoras com tuítes, e nesta terça-feira fez moedas se apreciarem ao redor do planeta – inclusive o real – ao dizer ao influente jornal The Wall Street Journal que o dólar está "muito forte".
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No dia em que a ata do Copom chancelou as interpretações do comunicado do BC, o presidente da instituição, Ilan Goldfajn, estava em Davos, na Suíça. A convidados do Fórum Econômico Mundial, disse que a política monetária ajudará na recuperação econômica, mas advertiu que será preciso adotar "ações complementares" para superar a recessão. A reação, pontuou Ilan, depende da retomada dos investimentos e de níveis crescentes de produtividade.
Se ancorou as expectativas de inflação com sucesso, o BC parece ter desancorado as de crescimento. Um dia depois de o Fundo Monetário Internacional (FMI) ter reduzido a projeção de avanço do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil para míseros 0,2%, a agência de classificação de risco Moody's apresentou uma estimativa na outra ponta do humor, de 0,9%. Na justificativa, pondera que "as projeções econômicas estão começando a melhorar modestamente e o pior da contração econômica provavelmente ficou para trás", mas reforça o adjetivo mais aplicado às palavras reação e recuperação neste ano: lento. "Vai levar tempo para o país reconquistar um ritmo firme de investimentos e utilização da capacidade instalada, após dois anos de contração econômica". Se forem só dois, já respiramos.