A vontade é de imitar o famoso narrador e gritar: "Acabou, acabou, acabou!!". Mas a forma de comunicação da quitação das pedaladas do governo federal – há outras sendo exercitadas – despertou o medo de que 2015 seja um ano que não terminará tão cedo. Opaca, propositalmente tecnicista, a entrevista do secretário interino do Tesouro Nacional mais escondeu do que relevou. A coluna pediu ajuda a Raul Velloso, experiente falcão das contas públicas, para destrinchar os desdobramentos da fórmula.
Na avaliação de Velloso, os impactos são os que já sentimos: mais inflação e mais pressão para elevar o juro básico. A escolha, segundo Velloso, passou pela falta de credibilidade do Brasil entre investidores. Emitir títulos de dívida de longo prazo agora, avalia, custaria o dobro da taxa Selic. Sobre a estratégia de transferir ao Tesouro ganhos contábeis das reservas internacionais, Velloso a compara a um investidor que tem dólares sob o colchão.
O dinheiro fica no mesmo lugar, e o dono anota em um papel sua valorização. É a comparação com o ganho contábil que permitiu ao Tesouro emitir poucos novos títulos de dívida, baseado na apropriação de uma riqueza teórica, mas perfeitamente legal, frisa o especialista. Velloso avalia que, embora exista lei permitindo o repasse, é uma "lei errada", que não deveria existir se o BC fosse independente:
– Não deveria ser permitido, porque esse dinheiro fica 'coçando' na mão do governo.
Se há uma consequência considerada inevitável por Velloso é a elevação do juro em 2015. O economista pondera que boa parte do efeito já está precificado – o mercado projeta alta de 1,5 ponto percentual no juro básico em 2016 exatamente por conta do anúncio de que as pedaladas seriam quitadas. A coluna espera, sinceramente, que as pedaladas fiquem em 2015. E, principalmente, que o ano não seja pedalado e se repita depois da zero hora do dia 1º.