Compreender a Babel moderna é tarefa árdua. O mundo tornou-se um labirinto de referências culturais. Perdemo-nos entre tantas formas de pensar e comportamentos exóticos. Até em casa sentimo-nos estrangeiros. Não chega a ser novidade: a invenção é o motor da aventura humana. Mas como adaptar-se a tantas e tão frequentes mudanças? Como não se angustiar frente ao aparente caos? A quem devemos ouvir? A quem vamos seguir?
Algumas pessoas, assustadas pelo tamanho da empreitada, pegam um atalho perigoso. Na esquina da facilitação vivem os gurus: vendendo certezas a quem não se sente capaz de fazer a própria síntese da realidade. O mentor surge quando alguém abdica de pensar por conta própria.
O guru apresenta-se como iluminado, encarna uma biblioteca universal, fala desde a experiência de Matusalém. É um mercador do saber que empresta chaves de interpretação simples à complexidade de tudo. Quem não quereria comprar? Afinal, é impossível navegar sem bússola pela existência.
A questão é o preço dessa mestria torta. A adesão infantiliza o usuário, criando uma dependência emocional ao fiador do saber. Encontrar um guru é fácil, difícil é sair da vassalagem amorosa que vem no pacote. Abrir mão dele é ser devolvido ao caos, à deriva da falta de sentido. Dispensá-lo é como abrir mão de um pai.
Quem assiste de fora repara o patético, o enganoso das teses simplórias travestidas de filosofia, mas não consegue transmitir ao discípulo a impostura do seu amado mestre
Todo guru é único, por isso seria incompreendido e marginalizado pela academia. Suas teses seriam tão revolucionárias, que só os iniciados, que ganharam o privilégio de ser escolhidos e tiveram um contato íntimo com a obra, o entenderiam. Por palmilhar cada área do conhecimento, ele toma ares de profeta e promete uma mensagem redentora para a humanidade. Seus discípulos respondem unindo-se numa seita.
Quanto mais avançamos no entendimento do mundo, mais ignorantes nos sentimos, pois subimos um degrau e enxergamos mais longe o que nos falta saber. Quando alguém arrota sapiência, esbraveja epifanias, percebemos não estar diante de um sábio. A sabedoria nos faz humildes e ponderados, pois encara as verdades como transitórias. Portanto é fácil reconhecer a fraude intelectual, basta escutar a gritaria das certezas e revelações.
Quem assiste de fora repara o patético, o enganoso das teses simplórias travestidas de filosofia, mas não consegue transmitir ao discípulo a impostura do seu amado mestre. Quem está tomado nisso não ouve racionalmente, o que ele escuta é como se disséssemos que seus pais são mentirosos e embusteiros. Para ele, a maçaroca delirante faz sentido e é necessária para se situar no mundo.
Infelizmente não existe vacina contra gurus e nem passar por um imuniza para não recair em outro. Mas a condição infantil do pensamento pode ser superada, não desista de seus amigos abduzidos por camelô de ideologias. Siga martelando, um dia eles acordam.