É possível ter uma performance de corrida melhor com o acompanhamento de música? Se a trilha sonora for uma condicionante para o treino, ou seja, a pessoa nunca correu sem fones de ouvido e não conhece outra realidade, a resposta pode ficar mais difícil. Mas já faz um tempo que pesquisadores tentam juntar algumas evidências para jogar luz no que tem sido uma questão mais de percepção individual do que científica.
Há os que defendem que correr sem música é dar ouvidos ao que está ocorrendo com o próprio corpo, como prestar atenção nas passadas, ouvir a própria respiração e os batimentos cardíacos. A impressão que eu tenho é que isso seja mais comum nos atletas menos amadores, mais preocupados em compreender os limites do organismo. Já reparou que esses correm sem fones de ouvido?
Por outro lado, um dos pontos a favor é a questão da percepção de esforço. A música seria capaz de "atrasar" as mensagens de fadiga enviadas pelo cérebro. Em um estudo sobre caminhada na esteira, o tempo de exercício, quando associado à música, aumentou em 15%. Em outra pesquisa, a prática mostrou melhora na largada do exercício. Com uma ressalva: o estímulo musical parece uma vantagem óbvia para quem está começando, mas se empolgar e se esforçar mais do que deve pode ter alguma consequência mais grave para alguns casos especiais, como os cardíacos.
Duas questões de segurança aparecem. Uma é a dos próprios ouvidos. A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que o uso de fones de ouvido seja restrito a uma hora por dia e em volume baixo para diminuir o risco de perda de audição. Outro alerta se refere à segurança. Para quem não está correndo em um parque ou pista fechada, pode ser arriscado ter a atenção reduzida por outros estímulos, como a música. Correr conectado a uma playlist próximo a locais de trânsito de veículos, por exemplo, não é aconselhável.
Mas que tipo de música faz diferença? Um relatório da Associação Britânica de Ciências do Desporto e do Exercício declarou que o impacto positivo pode ser ainda maior quando as canções forem selecionadas de acordo com suas qualidades motivacionais. Entre algumas das recomendações estão:
– Que a música esteja de acordo com o contexto sociocultural e faixa etária dos ouvintes.
– Seja funcional para a atividade, ou seja, o ritmo se aproxime dos padrões motores envolvidos.
– Seja selecionada de acordo com os efeitos desejados. Música alta, rápida e percussiva, com frequências graves acentuadas, pode ser uma intervenção capaz de aumentar a excitação, por exemplo.
– Deve estar dentro da faixa de tempo de 125-140 batimentos por minuto para a maioria dos exercícios de atividade repetitiva. Música mais lenta é apropriada para aquecimento ou finalização da atividade.
Mas há quem não pense em nada disso, só no prazer de ouvir música enquanto corre. Não costumo ter playlist de corrida. Prefiro ligar em uma seleção de rádio ou deixar tocar no modo aleatório, prestar atenção nas letras, relembrar velhas canções. Pode ser que a corrida seja um cantinho do dia em que ainda podemos ouvir música sem nos distrair com tantas outras coisas.