O compromisso primeiro de todo bom governante é buscar um alto índice de aprovação, certo? É, mas não deveria ser. O compromisso fundamental dos grandes governantes deveria ser fazer um grande governo, daqueles que se enraízam décadas à frente, ainda que à custa da popularidade momentânea, em troca de benefícios de longo prazo.
O governante que só pensa na sua aprovação popular antes de tudo é um populista. Ele hesita em adotar medidas duras, mesmo que necessárias, porque vão lhe custar votos. Como é mais fácil, e delicioso, abrir as burras públicas para espalhar agrados do que dizer não, esse governante age de olhos fixos nas próximas eleições. No governo passado, Jair Bolsonaro furou o teto de gastos em R$ 795 bilhões ao longo de quatro anos. Grande parte desse valor foi gasto em 2022, na tentativa de se reeleger. Além disso, Bolsonaro empurrou algo como R$ 120 bilhões em precatórios, uma conta que está sendo paga agora.
Saber cortar é uma arte que diferencia gestores medíocres daqueles que não temem perder pontos de aprovação agora para recolher os frutos de decisões difíceis lá adiante
Lula também é obcecado pela popularidade e, por isso, resiste em admitir a necessidade de cortes e de mexer na estrutura do Estado. Vamos admitir: só bebês molhados gostam de mudança. A imensa maioria dos eleitores também vê o setor público como uma fonte de recursos inesgotáveis que brotam do nada e demonstra pouco apreço à austeridade. Compreensível, porque o bacana é proclamar, como no governo Dilma, que “gasto é vida”. Mas há gastos e gastos. Saber cortar é uma arte que diferencia gestores medíocres daqueles que não temem perder pontos de aprovação agora para recolher os frutos de decisões difíceis lá adiante.
Veja-se o caso do governo Temer. Talvez ninguém tenha sido tão impopular como ele, por razões que vão desde o seu linguajar empolado até as trapalhadas com a JBS. Mas foi em seu governo que duas reformas cruciais, a da Previdência e a trabalhista, ganharam forma. Ao fim do mandato, Temer dificilmente se elegeria síndico de prédio, mas a estabilidade econômica e o nível de emprego de hoje devem muito a sua impossibilidade de reeleição.
No extremo oposto, temos Vladimir Putin. Ele engajou o país numa guerra que já matou dezenas de milhares de russos e ucranianos e abriu um fosso com o Ocidente, mas segue enfileirando uma reeleição atrás da outra. Apesar da sua popularidade, a Rússia e o mundo, seguramente, não estão melhores. Aqui do lado, na Argentina, em contrapartida, há uma experiência que merece atenção — um governante amalucado que repete “no hay plata”. Até agora, Javier Milei sobreviveu. Se a Argentina sair do coma, pode ser uma nova era para o velho populismo latino-americano: o governante que mexe a fundo as estruturas do Estado e ainda assim segue com alta aprovação.