O Brasil vive aquela situação angustiante do paciente acometido por doença grave que vem se negando a tomar a medicação capaz de reverter o curso da moléstia. A enfermidade vinha se desenvolvendo com a progressiva extravagância nos gastos públicos, mas se alastrou mesmo assim que a presidente Dilma passou a negligenciar os conselhos dos especialistas e a optar por charlatães que vendem terapêuticas milagrosas por meio do esbanjamento dos impostos.
Como resultado, seja quem liderar governo e parlamento nos próximos meses, o país estará diante de uma encruzilhada de vida ou morte: o paciente vai seguir acreditando em benzedeiras e mandingas que apregoam uma terapia sem sacrifícios ou vai finalmente se submeter a um tratamento profissional, sério e persistente?
De 1994, quando se instaurou a era do Real, até meados do primeiro governo Lula, Brasília adotara uma dieta despojada. Mesmo a contragosto das corporações e de alguns partidos, o país compreendera finalmente que a inflação era o veneno que intoxicava a confiança no Brasil e nossa chance de redenção futura. Com os sinais vitais bem monitorados, a economia brasileira respirou fundo na largada do mandato de Lula, tão logo o país percebeu que o antes agressivo vírus barbudo não se mostrava hostil ao mercado e até encarava resistências históricas ao receitar medicamentos pesados, como a reforma da Previdência. Era o tempo da bonança em que, no Banco Central, Henrique Meirelles acertava as contas e assegurava que o país dormisse sem tranquilizantes durante a crise de 2008/09.
Quando chegou ao Planalto, a ungida de Lula para a sucessão rasgou as prescrições de austeridade. Mesmo diante de sintomas que indicavam a evolução da gastança e da corrupção, Dilma liberou mais doces, frituras e menos exercícios para um paciente que requeria regime urgente. As pedaladas foram só a face mais rumorosa de uma gestão econômica concebida para assegurar a reeleição: quatro anos de irresponsabilidade fiscal, baseada no estímulo ao sedentarismo das finanças e à ingestão de mais gorduras pela coisa pública, é que levaram o país para a UTI onde se encontra agora. Quando Dilma tentou despachar o Brasil para o SPA de Joaquim Levy era tarde demais: ela foi sabotada pelo próprio partido ao ensaiar um regime de bons hábitos financeiros.
O germe da orgia com os cofres estatais, do fisiologismo e da rejeição a reformas permanece no ar na antessala do governo Temer e ameaça contaminar o paciente com uma infecção generalizada. Como se não houvesse amanhã, corporações e líderes partidários continuam fazendo planos para se entupir com aumentos de vencimentos públicos, cargos e verbas. Desta vez, porém, diante da extensão da doença, o custo de um novo porre de irresponsabilidade será bem mais alto do que uma mera dor de cabeça ao amanhecer.
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