Na eleição mais tensa da história recente dos Estados Unidos, o presidente americano Donald Trump segue ostentando comportamento pouco respeitoso e ameaça não reconhecer o resultado das urnas em caso de vitória do adversário, o democrata Joe Binden. Em mais um movimento que denota pouco apreço pelo regime democrático, Trump sinalizou que pretende levar a disputa à Suprema Corte, contestando o resultado se este lhe for desfavorável.
Como bem lembrou a repórter Marina Dias na Folha, a Suprema Corte é a instância para a qual Trump nomeou três juízes, conseguindo estabelecer, assim, ampla maioria conservadora.
A ameaça de Trump não é nova se analisada do ponto de vista do eleitor brasileiro. Em 2018, o então deputado federal e candidato à presidência da República, Jair Bolsonaro (à época no PSL), ameaçou:
- Não aceito resultado das eleições diferente da minha eleição.
Questionado pelo jornalista José Luiz Datena, que foi entrevistá-lo no hospital, o capitão foi além, para justificar sua desconfiança no sistema de votação eletrônico adotado pelo Brasil:
- Não confiamos em nada no Brasil. Até concurso da Mega-Sena a gente desconfia de fraude. Estou desconfiando de alguns profissionais dentro do TSE.
O que aconteceu depois, você já sabe. Bolsonaro foi eleito presidente do Brasil e, curiosamente, deixou pra trás a desconfiança no Tribunal Superior Eleitoral e no método utilizado para a escolha do chefe do Executivo.
A semelhança de posturas entre Trump e Bolsonaro se concentram menos na agenda econômica e mais em posturas anti-democráticas e pouco responsáveis. Como lembrou Bernardo Mello Franco, em O Globo, o capitão brasileiro já copiou do americano "tuítes destrambelhados, as teorias conspiratórias, as provocações à China e os ataques à imprensa. Só faltou besuntar o rosto com aquela pasta laranja".
Ao ameaçar contestar judicialmente o resultado das urnas, Trump desdenha daquilo que é caríssimo a uma democracia: a legitimidade da participação de todas e todos. E mais. Ao dizer que não aceita outro cenário que não sua vitória, o norte-americano incentiva uma polarização pouco inteligente e a proliferação de teorias conspiratórias, que em nada contribuem para o enfrentamento dos problemas sérios da nação.
Trump pode até negar, mas o mundo ainda enfrenta efeitos perversos de uma pandemia que não chegou ao fim. Estados Unidos e Brasil têm em comum um número recorde de mortes - por aqui, ostentamos a triste marca de mais de 160 mil vidas perdidas. Lamentável é que nem assim tenhamos nos livrados de delírios ideológicos e fakenews, legitimados por um chefe de Estado que pensa mais em seu futuro político do que no fortalecimento de uma nação. Tal como na pandemia, urge um comportamento digno de um presidente e não de uma criança mimada que sinaliza não saber perder.