Em meio a um crescente e assustador aumento no número de mortes provocadas pelo novo coronavírus, o presidente Jair Bolsonaro conseguiu produzir o que queria. Em uma canetada, nomeou nesta terça-feira (28) os novos titulares do Ministério da Justiça, André Mendonça, e da Polícia Federal, Alexandre Ramagem, mostrando que, a despeito do slogan de governo, é a vontade dele que está acima de tudo. A proteção aos filhos, acima de todos. O neodesafeto Sergio Moro avisou, na última sexta-feira: "O presidente me disse que queria ter uma pessoa do contato pessoal dele, que ele pudesse colher informações, relatórios de inteligência". E assim se fez.
A gravidade das declarações disparadas pelo ex-juiz da Lava Jato deixou o país boquiaberto, mas não constrangeu o titular do Palácio do Planalto. Surpresa? Nenhuma. Recentemente, Bolsonaro bradou à claque: "Eu sou a constituição".
Foi preciso que o decano do Supremo Tribunal Federal, ministro Celso de Mello, lembrasse, em despacho de 17 páginas publicado à noite passada, que o país vive sob um regime democrático e, esperamos que por precioso tempo, regido por um conjunto de leis que se sobrepõe (ou deveria se sobrepor) a vontades pessoais. Não, Bolsonaro, você não é a Constituição. E ninguém, ressaltou o ministro, está acima das leis neste país.
Celso de Mello foi certeiro. E, com sua decisão, está determinada a abertura de inquérito que irá apurar se foram cometidos os crimes de falsidade ideológica, coação no curso do processo, advocacia administrativa, prevaricação, obstrução de Justiça, corrupção passiva privilegiada, denunciação caluniosa e crime contra a honra. É pouco? O duríssimo recado do decano segue.
"O presidente da República – que também é súdito das leis, como qualquer outro cidadão deste País – não se exonera da responsabilidade penal emergente dos atos que tenha praticado, pois ninguém, nem mesmo o Chefe do Poder Executivo da União, está acima da autoridade da Constituição e das leis da República”, sublinhou.
Como frisou Mello, o presidente da República não pode se exonerar das responsabilidades dos atos que tenha praticado. É preciso investigar a fundo o que foi dito por Sergio Moro. Enquanto isso, milhares fazem filas em agências da Caixa Econômica Federal à espera de um auxílio que possa lhes dar o que comer, em meio à pandemia. Alguma coisa está fora da ordem. E quem deveria cuidar das pessoas sugere estar preocupado apenas com o próprio umbigo.