Uma série de políticos, autoridades e membros da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) reagiram nesta segunda-feira (29) à declaração do presidente da República, Jair Bolsonaro, que disse que poderia explicar ao presidente da entidade, Felipe Santa Cruz, como o pai dele desapareceu durante a ditadura militar. A coluna conversou com a advogada gaúcha Nadine Borges, que é vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB do Rio de Janeiro e também presidiu a Comissão da Verdade naquele Estado. Para a advogada, é necessário lembrar que "tortura é crime imprescritível".
— Fernando Santa Cruz foi torturado por agentes do Estado no exercício de suas funções. Estamos diante de um crime de lesa-humanidade em um país que homenageia torturadores. Toda solidariedade e humanidade ao presidente Felipe Santa Cruz — destacou à coluna.
A manifestação de Bolsonaro ocorreu em um contexto em que o presidente reclamava da atuação da OAB na investigação do caso de Adélio Bispo, autor do atentado a faca do qual foi alvo.
— Por que a OAB impediu que a Polícia Federal entrasse no telefone de um dos caríssimos advogados? Qual a intenção da OAB? Quem é essa OAB? Um dia, se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, conto pra ele. Ele não vai querer ouvir a verdade. Conto pra ele. Não é minha versão. É que a minha vivência me fez chegar nas conclusões naquele momento. O pai dele integrou a Ação Popular, o grupo mais sanguinário e violento da guerrilha lá de Pernambuco, e veio desaparecer no Rio de Janeiro — disse o presidente, nesta segunda-feira (29).
Nadine completou, sobre o trabalho realizado pela Comissão da Verdade, criada para apurar crimes e irregularidades cometidas durante o período da ditadura militar:
— A Comissão Estadual da Verdade e a Nacional examinaram à exaustão, dentro dos limites possíveis, de não abertura dos registros das Forças Armadas. As pistas indicam que ele pode ter sido levado pra Casa da Morte. Estamos diante de um chefe de Estado reconhecendo a tortura e desrespeitando a memória de um pai que foi desaparecido e torturado pelo próprio Estado — completou.
Presidente da OAB
Felipe é filho de Fernando Augusto Santa Cruz de Oliveira, desaparecido em fevereiro de 1974, depois de ter sido preso junto de um amigo chamado Eduardo Collier por agentes do DOI-CODI, no Rio de Janeiro. Ele tinha dois anos quando o pai desapareceu.
Fernando era estudante de Direito, funcionário do Departamento de Águas e Energia Elétrica em São Paulo e integrante da Ação Popular Marxista-Leninista. No relatório da Comissão da Verdade, responsável por investigar casos de mortos e desaparecidos na ditadura, não há registro de que Fernando tenha participado de luta armada.