O funcionário da segurança do banco só seguia o protocolo que impunha um ritual de senha e contrassenha para quem acessasse a área dos cofres privativos. Quando ouvimos o clássico "O senhor tem ideia de com quem está falando?", percebemos logo, pelo tom de voz, que tínhamos sido agraciados pela companhia de um extraclasse.
Só precisávamos descobrir se essa credencial era real ou uma fantasia do credenciado, porque a distância entre o que de fato somos e como gostaríamos que nos vissem pode ser quilométrica.
Os humildes, ajustados aos critérios que definem humildade, se satisfarão com a identidade básica, essa que consta nos documentos oficiais.
No outro extremo, habitam os deslumbrados com alguma fama aguda e fortuita, e que com graus variáveis de narcisismo tratam os circundantes como lacaios, uns coitados que nascem com a função exclusiva de reverenciá-los.
Dar visibilidade aos humildes é escancarar o filão da gratidão na sua forma mais pura.
Esses deslumbrados se negam a acreditar que alguém possa não reconhecê-los e não têm a menor ideia do quão provável é que, no futuro, se tornem sócios honorários do clube dos ignorados crônicos. E com louvor.
Quando avançamos para o valor que se dá a quem se tornou, de alguma forma, reconhecido, os comportamentos também podem divergir substancialmente. Entre os famosos, se reconhece as pessoas do bem, que circulam entre seus pares com a serenidade madura de quem não precisa provar nada porque está em paz consigo mesmo, e os mal afamados que, se não chamassem tanto atenção, usariam sempre um capacete, porque não conseguem andar na rua sem serem importunados e, naturalmente, odeiam voos de carreira. Esses estão condenados de antemão à solidão na velhice, porque a biografia constrangerá os parentes, e os cúmplices que durante um longo tempo foram confundidos com amigos vão abandoná-los quando não houver mais o que cumpliciar.
Entre os humildes, há um subgrupo dos que são tratados como invisíveis, e muita gente, mais apressada em aparentar do que interessada em ser, não se envergonha em assumir que cuidar dessa turma é desperdiçar o escasso tempo da construção da sua própria notoriedade.
Depois que aprendi que dar visibilidade aos humildes é escancarar o filão da gratidão na sua forma mais pura, passei a insistir com meus alunos para que deem o máximo valor à identidade, primeiro degrau da visibilidade.
E o teste proposto é simples: quando um paciente, com a subserviência inconfundível dos desamparados, sentar-se à sua frente, com olho no olho, sem olhar na ficha do ambulatório, perguntem: "O que posso fazer para ajudar o nosso Jose Inácio Silveira e Silva da Silva?". Quanto maior o nome, maior o afago na autoestima atrofiada.
O brilho na córnea e aquele meio sorriso que se completaria, não fosse a timidez, são a senha de acesso ao mundo ideal que ele nunca imaginou merecer.
Daí por diante, teremos dois seres humanos ao alcance mútuo de um simples toque de mão. E iguais, que é como melhor nos sentimos.
Um, feliz por ter descoberto o prazer de ajudar, e o outro, encantado com a diferença que faz ser tratado como gente.