A jornalista Carolina Pastl colabora com a colunista Gisele Loeblein, titular deste espaço.
Com foco em gerar impacto positivo ao ambiente à sua volta, a empresa que opera a usina hidrelétrica Passo Fundo, em rio de mesmo nome no norte do RS, mirou no agro para juntar esforços. A companhia é a Engie Brasil Energia, que desenvolveu o programa Regenera+ em parceria com o Sebrae em oito dos nove municípios lindeiros ao empreendimento.
Proposto pelo Sebrae com consultoria da FAU Agricultura & Meio Ambiente, empresa que oferece serviços ambientais, o projeto busca implementar práticas da agricultura regenerativa (voltada para a recuperação de ecossistemas) em 17 propriedades rurais da região. No segundo ano de programa, já tem como resultado uma redução de 32% nos custos de produção e o dado de que, juntas, as propriedades são carbono negativo — ou seja absorvem mais do que emitem o gás que é um dos responsáveis pelo efeito estufa.
De acordo com a coordenadora de processos ambientais na Engie Brasil, Grasiela Carodoso, além de trazer benefício às comunidades, a empresa também se mobilizou pela necessidade de ter o entorno conservado:
— A Engie operando com uma usina hidrelétrica depende do entorno com qualidade de reservatório. Evitar a contaminação dele com produtos fitossanitários, por exemplo.
No Sebrae, a analista da instituição no Estado Catia Regina Roy explica que o objetivo do projeto foi levar inovação aos pequenos negócios, neste caso, as propriedades rurais:
— Nossa preocupação era transformar as propriedades efetivamente em sustentáveis do ponto de vista econômico e social. Além de trabalhar a sustentabilidade como um todo, olhar também para a parte financeira das propriedades para que os produtores colocassem em prática os ensinamentos.
A iniciativa é estruturada em quatro frentes: a de mapeamento da propriedade, a da implantação de biofábricas, a do balanço de carbono e a da verificação do cumprimento de indicadores de ESG (sigla para governança corporativa, social e ambiental). O mapeamento serviu como uma espécie de diagnóstico da terra para se começar os trabalhos, já que gera um mapa temático a partir de imagens aéreas georreferenciadas, explica o gerente de projetos na FAU Agricultura & Meio Ambiente, Jean Budke.
— Na primeira fase, desenvolvemos um mapa separado pelos usos da terra, localizando onde estão os talhões, os cursos hídricos, as áreas de floresta. Muitas vezes, é a primeira vez que os produtores sabem o tamanho das suas propriedades — acrescenta Budke.
Também foi feito um balanço inicial de carbono — cálculo da diferença entre as emissões e as absorções de carbono, a partir da coleta de amostras de solo, e uma avaliação dos indicadores de sustentabilidade para entender o quão inserida nas práticas de ESG cada propriedade rural participante está. No final deste ano, a ideia é coletar novamente os dados para compará-los e ter mais informações da eficiência do projeto.
Com a “radiografia” da propriedade feita, a equipe partiu para a ação. A assistência técnica que visitou os locais rotineiramente incentivou a adoção do sistema de plantio direto, a intensificação da cobertura da terra e o uso de bioinsumos nas lavouras.
Além de utilizar os biológicos, também foi incentivada a produção deles na propriedade. Para isso, se instalou uma biofábrica dentro da fazenda de cada um dos participantes. Nela, os agricultores fizeram a multiplicação de microorganismos em bombonas plásticas, tecnicamente chamadas de “câmaras de multiplicação”, produzindo, então, os bioinsumos. Alguns desenvolveram bactérias para fertilidade do solo, outros para controle de pragas, tudo de acordo com a cultura cultivada no local, para consumo próprio e com assessoramento.
E foi nesta fase do projeto, aliás, que os produtores já conseguiram perceber os primeiros benefícios. No caso do produtor rural no município de Quatro Irmãos, a 15 km da hidrelétrica, Claiton Eduardo Ruch, a principal vantagem até agora foi no bolso. De acordo com ele, seus custos com insumos na lavoura onde planta milho, soja, trigo e aveia reduziram uma relação de R$ 100 para R$ 15.
— A assessoria que tivemos foi o mais interessante. Pudemos conhecer novos produtos, novas bactérias que poderiam nos auxiliar com a nossa produção — acrescenta o produtor.
A iniciativa também despertou o lado de cientista do filho de Claiton, o Gustavo. Cursando o sétimo semestre de Agronomia na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFSS), Gustavo levou alguns dos produtos multiplicados na propriedade para testar a eficiência no laboratório de fitopatologia da faculdade com uma professora.
— Estou animado. A gente só tem o custo dos produtos para fabricar os bioinsumos e os inóculos — afirma o estudante, que também pretende seguir aprimorando a tecnologia na propriedade.
O projeto é voluntário, metade custeado pelo Sebrae e a outra metade pela Engie. As propriedades rurais que estão sendo trabalhadas foram sugeridas pelas próprias prefeituras e Emater locais. Agora, a ideia é seguir o projeto em outras regiões onde a companhia tem usinas no país.
A usina hidrelétrica Passo Fundo se localiza no rio de mesmo nome, no município de Entre Rios do Sul, no norte do Estado. Possui um reservatório de acumulação de 151 quilômetros quadrados, duas unidades geradoras e capacidade total instalada de 226 MW.