De uma tradicional família de médicos — é bisneto de Protásio Alves, que dá nome a importante avenida da Capital —, Flávio Montenegro Alves tinha tudo para seguir o caminho da Medicina. E seguiu: mas o da Medicina Veterinária. Formado pela PUCRS, acumula mais de 30 anos como inspetor técnico da Associação Brasileira de Angus. É descrito como um dos olhos mais bem preparados para observar as características desejadas na raça. Habilidade que também o alçou à condição de jurado em exposições, incluindo a Expointer, que no próximo mês abre as pistas para novos campeões. Ao longo da carreira, observou as transformações da pecuária, com novas ferramentas para medir fatores importantes à produção. Sobre a atividade que desempenha, afirma:
— Não é só a função zootécnica. Nosso papel é decisivo para estimular o criador dentro da raça.
Na entrevista à coluna, ele conta mais detalhes da trajetória profissional. Confira trechos.
Hoje, olhamos muito mais informação. Para poder premiar o belo que também seja um bom animal. O belo faz bem para os olhos e o bom, para o bolso. Sempre quis ser veterinário ou foi uma escolha que veio com o tempo?
Sou nascido em Porto Alegre e filho, neto e bisneto de médico, meu bisavô era o Protásio Alves. Mas meu pai tinha uma propriedade em São Jerônimo. Aos finais de semana, íamos para fazenda. Foi aí que peguei o gosto por animais e pela vida rural. Então, sempre coloquei na minha cabeça que seria alguma coisa pro lado rural e sempre pendendo para o lado dos animais. Sofri uma pressão muito grande para ser médico, mas resisti e fui fazer o que sempre gostei.
Como foi a mudança para a Fronteira, onde vive até hoje?
Cheguei a fazer dois anos da faculdade de Direito, sem gostar do que estava fazendo. Foi quando li pela primeira vez O Tempo e o Vento, do Erico Verissimo, que é um livro também muito ligado à parte do campo. Ficou muito evidente o que eu queria fazer e me inscrevi no vestibular, escondido. Avisei em casa quando passei no vestibular, dizendo que estava indo para Uruguaiana. Me formei lá. Fui morar com um primo meu, veterinário, em Alegrete, que trabalhava em uma cabanha conhecida (a cabanha Azul). Conheci minha esposa e nunca mais saí de lá. Meu sogro também era pecuarista, trabalhava com animais angus, e me convidou para trabalhar com ele. Ali desenvolvi a paixão pela raça. Trabalhei muito tempo com ele.
Como assumiu a função de inspetor técnico da raça angus? Qual o papel desempenhado?
Fui convidado para ser técnico da raça na região. Por ser técnico, fui convidado a julgar exposições e por aí vai a história. O inspetor técnico é a ligação da associação da raça, no caso a angus, e a Herd-Book Collares, de registro, do campo com a associação. Não é só chegar e dizer se o animal serve ou não, se atende ou não aos padrões da raça. Tem papel de fomento, de divulgação, de orientação, para que evolua não só na face fenotípica, mas também de melhoramento genético. É bem amplo o papel. É decisivo para o produtor permanecer, para estimulá-lo na raça. Tem muita conversa trocada com o criador na propriedade, a gente vira um conselheiro. Não é só a função zootécnica. Temos de nos manter informado, atualizado para poder orientar.
Que características são desejáveis em um inspetor técnico?
Primeiro, um conhecimento da raça, gostar do que faz. E esse perfil do técnico que tem de lidar com os donos dos animais. Somos um mensageiro da associação. A relação com o criador tem de ser para que sempre se sinta estimulado, orientado, por dentro do que está acontecendo.
O que o jurado avalia no animal no momento de uma exposição como a Expointer?
Não lembro quando foi a primeira exposição que julguei, mas deve fazer uns 25 anos. E houve uma transformação muito grande na questão de julgamento. Antes, era exclusivamente fenótipo, beleza racial: o mais bonito é o que ganha. Aprendemos, com o tempo, que nem sempre o mais bonito era o mais produtivo. Começamos a tentar unir fenótipo ao genótipo. E a busca constante é essa: que o mesmo touro ganhador da exposição também seja um bom animal a campo. Hoje, olhamos muito mais informação, que o jurado tem disponível, como a ultrassonografia de carcaça. Para poder premiar o belo animal que também seja um bom animal. O belo faz bem para os olhos e o bom, para o bolso. Tem de ter produtividade e, consequentemente, rentabilidade.