A jornalista Bruna Oliveira colabora com a colunista Gisele Loeblein, titular deste espaço.
A percepção de que falta integração entre os elos da cadeia produtiva da carne, gerando enfraquecimento do setor, é unânime. Mas um primeiro passo para alinhar soluções foi dado ontem, em evento que reuniu os principais atores desse mercado de forma inédita, no 1º Fórum da Cadeia Produtiva da Carne Bovina do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre. A falta de rentabilidade está entre os principais problemas citados desde a cabanha até o frigorífico e o varejo.
Representando os pecuaristas, os produtores João Ghaspar de Almeida e Fernando Costabeber falaram das adversidades de dentro da porteira, que passam dificuldades inerentes à sanidade animal, infraestrutura, ambiente e relações de mercado. Sobre este último ponto, Almeida frisou a necessidade de se traçar estratégias de produção direcionadas ao varejo, acompanhando as novas tendências de consumo e também o novo perfil de produtores.
Fernando Costabeber acrescentou a importância de se valorizar a produção da carne gaúcha, usando como inspiração o exemplo do Uruguai. Costabeber fez uma comparação ao mercado competitivo do país vizinho, que tem rebanho semelhante ao do Rio Grande do Sul, mas que abate mais e tem produção e valor de exportação maiores. Dos 35 frigoríficos uruguaios, 19 são habilitados para exportar para a China, por exemplo, contra apenas um no RS.
Do lado da indústria, Ronei Lauxen, presidente do Sicadergs, chamou atenção para o número de empresas frigoríficas gaúchas em operação, que somam 226. O número alto, diz, é fomentado pelo próprio produtor, que busca diariamente novas alternativas. Ainda assim, 50% das plantas estão operando com ociosidade. Um dos motivos é a queda nos abates desde 2021, que leva a uma baixa acumulada de 25% nos últimos dois anos nos frigoríficos do Estado.
Para o dirigente, a falta de rentabilidade é um problema para a cadeia toda:
— Como vamos fechar essa conta? O produtor precisa mais, a indústria precisa mais, e o consumidor quer comprar por menos. Esse é o grande desafio que nós temos.
O elo final da cadeia, ou seja, o varejo, foi representado pelo presidente da Associação Gaúcha de Supermercados (Agas), Antonio Cesa Longo. O dirigente frisou que o setor continua valorizando a carne, sobretudo a gaúcha, pela qualidade reconhecida. O açougue representa, em média, 20% das vendas nos supermercados, com mais da metade para cortes bovinos. É a principal categoria visitada pelo consumidor, mesmo enfrentando oscilação durante o ano e migração entre as proteínas.
— Vocês têm o principal produtor do supermercado e o supermercado não pode ficar sem o produto de vocês — disse Longo.
Na avaliação do professor Júlio Barcellos do Núcleo de Estudos em Sistemas de Produção de Bovinos de Corte e Cadeia Produtiva (NESPro) da UFRGS, quem paga a conta é o consumidor. O que está em jogo, diz, é um novo conceito de negócio em carnes, focado em cadeia de valor. Uma estratégia híbrida, combinando mercado convencional, de preço competitivo, a um mercado especializado, com carne "gourmet", seria uma opção.