O Brasil precisou de 15 anos e de muita persistência para abrir as portas do mercado americano à carne bovina in natura. E, em bem menos tempo do que isso, viu essa oportunidade se perder em meio aos ruídos da Operação Carne Fraca e das delações feitas pela JBS, maior processadora de proteína animal do mundo. A suspensão das importações é vista como algo temporário, possível de ser revertida.
Mas há bem mais coisas entre os abscessos identificados pelas autoridades sanitários dos Estados Unidos na carne e o embargo imposto do que supõe nossa vã filosofia. É sabido que os americanos são nossos concorrentes diretos no mercado global de carne bovina – o Brasil foi o maior exportador mundial no ano passado. A entrada do produto brasileiro na terra do Tio Sam sempre incomodou pecuariastas locais.
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A Operação Carne Fraca já havia fornecido munição para que os produtores reclamassem e, apesar de balançar as portas, não fez elas se fecharem. Agora, juntou-se a fome com a vontade de comer. Ou seja, achou-se um argumento técnico capaz de barrar a carne bovina. Há que se considerar, no entanto, o ingrediente especulativo e protecionista dessa questão.
– Essa é uma forma de endurecer a negociação dos preços. Se você está fragilizado, seu comprador poderá exercer a pressão dele – avalia Gustavo Aguiar, zootecnista da Scot Consultoria.
A reação brasileira diante do fato apresentado precisa ser rápida e clara, sem brechas. Segundo a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec), uma missão do país fará isso nas próximas semanas.
Os EUA compram do Brasil basicamente carne de dianteiro, utilizada para a produção de hambúrgueres. A importância não está na quantidade e, sim, na representatividade – de janeiro a maio deste ano, o envio de carne bovina in natura aos americanos representou apenas 3% do total. Vender para os americanos abre outras janelas de oportunidades. Parar de negociar com eles pode fazer com que outras nações sigam o mesmo caminho. E isso não é nada bom. Por enquanto, o que ainda conforta é que o mundo depende da proteína animal brasileira para seguir se alimentando. Mas é preciso oferecer mais do que esse argumento simplista se quisermos impedir que nosso produto seja alvo de pressões internas dos mercados em que entra.