A tragédia do submarino argentino, que o mundo acompanha perplexo e angustiado, me leva a perguntar: nas Américas, em tempos de paz e mercado comum, em que um país consome o que o outro produz e o diálogo marca o entendimento, serão necessárias sofisticadas armas de guerra, com os perigos que delas derivam?
A pergunta pode parecer infantil, mas nunca descabida. Já não há disputas territoriais. Somos "hermanos" no comércio, na ciência e até nos acordos militares e na patrulha de fronteiras. Só o futebol nos separa (como agora, na Arena do Grêmio), mas o furor nas relações se resume a isto.
Aqui, a guerra é real, por milhõe$ de reai$ e contra 207 milhões de habitantes.
Assim, para quê submarinos, essas caríssimas armas de ataque, que pouco servem à paz? Submarino se esconde e ataca, guerreia pelo terror traiçoeiro. Na II Guerra Mundial, submarinos alemães afundaram 33 navios mercantes ou de passageiros do Brasil, matando mil pessoas antes de declararmos guerra a Hitler.
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Agora, no extremo sul continental, o submarino argentino tinha brincado de guerra e concluído um exercício naval "contra o inimigo". Mas, que inimigo? Paraguai e Bolívia, vizinhos sem mar? Ou Brasil, Uruguai e Chile, unidos à Argentina por tratados de cooperação que incluem o vasto mar?
Estamos no século 21, longe das estúpidas lutas dos séculos 18 e 19. Hoje, a violência é interna, não externa.
Os inimigos já não são as fronteiras. Ao vigiá-las, não buscamos os vizinhos estrangeiros, mas, sim, o crime, a droga e o contrabando, que não têm pátria e são o mar multinacional da violência, acima do racional e da ética.
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Mas cultivamos a violência até sem perceber. O papa Francisco adverte sobre os enganos da sociedade de consumo (agora denunciou a inércia ante o inferno do câmbio climático), mas somos surdos e a cobiça manda mais do que a vida.
E a violência germina. Do assalto de rua (com ou sem tiros) à corrupção que domina o poder no conluio entre políticos e grandes empresas, aturamos viver num mundo drogado, subornados pela mentira. O novo chefe da Polícia Federal se atreve a dizer que "uma única mala" com meio milhão de reais, carregada por um assessor de Temer, não é motivo para denúncia por corrupção, e apenas rimos do absurdo.
Não vemos que nos deixam sem ar, submersos no infecto mar de um sistema partidário dirigido por pigmeus. E tão sufocados como os 44 tripulantes do submarino argentino, vítimas de uma guerra de mentira. Aqui, a guerra é real, por milhõe$ de reai$ e contra 207 milhões de habitantes.