Deu no que deu: mais de 400 mil brasileiros mortos e colapso do sistema de saúde.
Desde que surgiram os primeiros casos no Brasil, infectologistas, epidemiologistas e muitos especialistas ligados à academia advertiram a sociedade de que o caminho seguido pelo governo federal nos levaria ao colapso do sistema de saúde e causaria uma tragédia sem precedentes.
Infelizmente, nossas previsões mais pessimistas se confirmaram: o número de mortes bateu recordes mundiais e UTIs ainda estão superlotadas. Pela primeira vez, começamos uma campanha de vacinação sem vacinas em número suficiente.
Não há perspectiva de melhora a curto prazo, o mês de maio ainda nos reserva muitas tristezas. Colapso do sistema de saúde significa viver num país sem hospitais para ricos ou pobres (claro que pior para estes), tenham covid ou outra doença.
É fundamental que a sociedade distribua cestas básicas e ajuda financeira aos mais necessitados.
O Brasil estava fadado a ser um dos principais epicentros da pandemia. Um vírus que se transmite pelas gotículas que expelimos ao falar, cantar, tossir ou espirrar exige afastamento social para ser contido. Mesmo que tivéssemos agido de acordo com as melhores recomendações da Organização Mundial da Saúde e os exemplos dos países que conseguiram controlar a pandemia, seria muito difícil manter em casa os 50 milhões de brasileiros pobres que vivem nas periferias das nossas cidades, cerca de 10 milhões dos quais preenchem os critérios para a classificação de pobreza extrema.
Num dos países mais desiguais do mundo, essas pessoas dependem do trabalho informal diário para alimentar a família. Com a debacle econômica dos últimos anos agravada pela pandemia, a única possibilidade de sobrevivência foi o auxílio emergencial. A ajuda de R$ 600 por mês garantiu pelo menos a alimentação básica de milhões de pessoas.
O fim do auxílio em dezembro passado e a atual retomada na faixa de R$ 200 provocaram o retorno da fome epidêmica em nosso país, flagelo do qual custamos a nos libertar nas últimas décadas do século 20. Os mais velhos devem se lembrar das campanhas contra a fome lideradas por Betinho, nos anos 1980.
Os relatos que tenho ouvido de lideranças comunitárias insuspeitas são de assustar. Não será possível convivermos com a fome que se espalha nos cinturões periféricos das cidades, como fizemos em séculos anteriores com as crianças desnutridas e com os retirantes que morriam nas estradas do Nordeste para fugir das secas.
Dizer que o presidente da República foi o grande responsável pela disseminação do coronavírus, promovendo aglomerações sem usar máscara, não resolverá a emergência atual. Deixemos que a Justiça criminal se encarregue de julgá-lo. O momento é de agir.
É fundamental que a sociedade distribua cestas básicas e ajuda financeira aos mais necessitados. Num país de dimensões continentais, com tantos entraves burocráticos, não é tarefa corriqueira catalogá-los, mas, se houver organização e transparência na aplicação dos recursos, as empresas e a população brasileira não se furtarão a esse dever.