Não é fácil exigir razão da paixão. Ou combiná-las. Mas é o que está diante da torcida do Grêmio na volta do público à Arena, neste domingo, às 20h30min — no Beira-Rio é só no próximo fim de semana. Antes do jogo em si, é preciso dar-lhe a dimensão correta. Nunca mais esqueceremos dele.
Depois de ano e meio privados de uma das cenas mais simbólicas do que é ser brasileiro, está de volta o estádio com gente dentro, sempre lotado das nossas idiossincrasias. É um emblema de sobrevivência. Da humanidade, através da fantástica rapidez com que a ciência isolou o vírus e produziu as vacinas que salvam até os idiotas que as desprezam. É emblemático também para os clubes. A dupla Gre-Nal saiu-se bem.
Seus torcedores, aos milhares, seguiram pagando mensalidades de sócio mesmo com a queda brutal na renda familiar, efeito perverso da covid-19 na economia. Manter essa receita fixa foi essencial. É como você pagar durante meses a escola de seu filho sem ele assistir aulas ou comprar ingresso para shows sabendo que não irá. Razão e paixão combinadas. Futebol. Os jogadores aceitaram redução salarial, no Inter. No Grêmio, deu-se um empréstimo sem juros ao clube. Nos dois casos, houve colaboração.
O espetacular Gre-Nal da vacina estimulou a imunização dos mais jovens. A própria volta do público exige certificado com as duas doses — pegue o seu acessando ConecteSUS: é moleza —, o que também ajudou a ampliar a cobertura vacinal e a convencer os céticos sobre a óbvia necessidade. Nem todos emergiram da pandemia sem problemas. O Bahia e o Sport se atolaram em dívidas. Talvez sejam rebaixados por isso.
No caso do jogo em si, o histórico Grêmio x Sport não será, para os gremistas, um retorno de público marcado por empurrar o time rumo ao título, como nos últimos anos, mas escapar do fiasco que seria um terceiro rebaixamento. O time não é o dos sonhos, definitivamente.
O ídolo Maicon se foi. Geromel e Kannemann estão lesionados. Douglas Costa não engrena. Restaram Léo Pereira, Thiago Santos e outros ainda longe de entrar no coração azul. Felipão garante que a derrota para o Athletico-PR foi acidente de percurso. Que valem os bons jogos com Flamengo e Ceará.
Bem, o fato é que o Grêmio não está no Z-4 há meses por mostrar futebol confiável. Então, ainda que seja contra o inofensivo Sport, a torcida terá de ter paciência e apoiar. Quando vier o erro de passe e a lentidão, o melhor a fazer é respirar fundo e apoiar. Vaiar não adiantará. Pior: atrapalhará. Se já não está bom assim, imagine com nervosismo que aumenta a chance de erro e tisna a lucidez até dos mais lúcidos em campo.
Eis, portanto, o enorme desafio da torcida gremista: resiliência na paixão. Se conseguir, turbinará o futebol do Grêmio. Cabe ao tricolor decidir, combinando razão e paixão, a partir deste domingo, a história que será contada e escrita: no ano de 2021, mês de setembro, já na primavera, a volta do público à Arena foi decisiva para o Grêmio, enfim, sair do Z-4 e escapar do terceiro rebaixamento, graças ao apoio incondicional de sua torcida. Ou não.