Se casos como o tumulto na Virgínia fossem exclusivamente ocorrências de neonazismo, seria um alívio.
Os neonazistas do século 21 não passam de punhados de desmiolados. Podem até ser perigosos em conflitos isolados, mas são tão ridículos, que acabam se tornando insignificantes.
Mas, não.
O que se deu na Virgínia é mais amplo e reflete ondas de insatisfação que atingem todo o Ocidente, inclusive o Brasil.
Nos Estados Unidos, esse descontentamento aparece como revolta contra interferências externas em questões regionais; na Europa, como o medo do extremismo muçulmano; no Brasil, em destrambelhados que pedem a volta da ditadura. Parecem fenômenos diferentes, mas todos têm a mesma origem, expressada com exatidão por aquele pai acusado de ter cometido ato de homofobia na festa de formatura da filha:
"Ninguém defende o homem branco heterossexual".
O que ele queria dizer? O homem branco heterossexual, afinal, nunca foi discriminado. Mas, hoje, tornou-se alvo do achaque crítico de grupos politicamente corretos. Basta o título deste conjunto de crônicas, "homem branco heterossexual", para gerar certo desconforto ideológico. Porque o homem branco heterossexual está sempre sob suspeita de ser preconceituoso, está sempre na iminência de ser julgado pelo que pensa ou sente. E, uma vez julgado, será irremediavelmente condenado.
Não existe, neste caso, o ônus da prova de quem acusa. Se um homem branco heterossexual for acusado de racismo por um negro, de machismo por uma mulher ou de homofobia por um gay, ele será execrado. Isso virou regra na sociedade ocidental. O exemplo mais recente é o de Chico Buarque, acusado de ser machista por compor uma música na qual o personagem diz que larga mulher e filhos por um amor, o que comprova, mais uma vez, que muitos desses grupos politicamente corretos podem até ser corretos, mas têm dificuldade de interpretação de texto.
Foi disso que se queixou aquele homem na entrevista que deu para nós, na Rádio Gaúcha. É essa a causa do confronto na Virgínia, da eleição de Trump, do Brexit, do crescimento de Bolsonaro. Ou, pelo menos, a mais importante das causas.
Os grupos politicamente corretos, de fato, exageram. É muita belicosidade, é muito mau humor, é muita intolerância e muito pouco bom senso. Só que a reação é a pior possível. Gente violenta, empunhando armas, gritando palavras de ódio debaixo de capacetes, protegida por escudos, essa gente passou dos limites. Nos Estados Unidos, na Europa e no Brasil.
No Brasil, o risco mais sério é a eleição de um tipo bizarro como Bolsonaro – o que realmente pode acontecer, acredite.
É preciso uma mudança de comportamento. É preciso que pessoas que são contra o racismo, o machismo e a homofobia entendam que o mundo ideal não é o que abre mais diferenças, e sim aquele em que todos sejam iguais. Liberdade, igualdade e fraternidade, diziam antigos franceses.
É impossível construir pela exclusão. É impossível fazer o bem pela violência. Os grandes homens da humanidade ensinaram essa lição. Ou a aprenderam. Não foi o violento Malcolm X quem redimiu os negros nos Estados Unidos; foi o pacífico Martin Luther King, o que foi reconhecido pelo próprio Malcolm no fim da vida. Não foram as armas que libertaram a Índia, foi a mansidão de Gandhi. Não foi o Mandela terrorista quem salvou a África do Sul; foi o Mandela do sorriso, do abraço e do amor. E, no Brasil, nenhuma feminista radical fez mais pelas mulheres do que Leila Diniz com sua beleza, sua leveza e sua paixão pela vida.
Se acreditarmos que gerações atuais são responsáveis pelos erros de gerações passadas, se acreditarmos que existem dívidas de nações, gêneros ou raças, o mundo jamais encontrará a igualdade ideal.
Isso não significa dizer que mulheres, negros, gays e judeus não sofreram e sofrem discriminação. Sofreram, sofrem e precisam de proteção.
Isso também não significa dizer que homens brancos heterossexuais sejam pobres coitados. Não são, nunca foram.
Isso significa dizer que homens, mulheres, gays, negros, judeus, islâmicos, japoneses e tudo mais que houver precisam viver em harmonia. E a harmonia não é construída com luta, é construída com paz.