Um maço com 400 volantes de Mega Sena repousa sobre a mesa do escritório de Ortenilo João Nicolau, 72 anos. Desde que ganhou sozinho um dos maiores prêmios individuais da história do concurso, aposta feita em Fontoura Xavier, em 2010, ele não abandona o vício. Quando o sorteio acumula, gasta de R$ 2 mil a R$ 3 mil. Se um raio cair duas vezes no mesmo lugar – "E cai", diz ele –, já sabe o que fará com o prêmio.
– Pode anotar aí: vou doar tudo! Prometo!
O senhor ganhou R$ 119.142.144,27 na Mega Sena. O que fez com tanto dinheiro recebido da noite para o dia?
Investimentos. Melhorei a vida de toda a família, mas comprei cinco fazendas para plantio de soja, milho e arroz e criação de gado no sul do Estado. Também mantenho uma boa estrutura para armazenamento de safra, silos. E apliquei muito em imóveis, o que me garante uma boa fonte de renda.
Como o senhor escolhe os números das apostas que faz?
Em geral, jogo os mesmos números. São 54 cartões, no total. Se a Mega está pagando pouco, aposto pouco, mas, se acumula, eu carrego nas apostas. Acumulou de novo, faço mais um montinho de volantes. Na última vez que acumulou (concurso sorteado no dia 29 de julho, prêmio de R$ 105 milhões), fiz 400 cartões, gastei R$ 2,8 mil. Não tenho critério específico. Gosto de alguns números, em geral ligados à data do meu nascimento. Faço meus jogos assim: a minha idade, o dia em que eu nasci, o mês e o ano.
Se o senhor ganhar de novo na Mega Sena, o que fará com o prêmio?
Já falei para minha esposa: vou doar tudo! Talvez criar alguma organização para ajudar as pessoas que mais precisam. Hoje eu tenho a vida plenamente realizada. Não tenho, assim, tanto dinheiro. Tenho o dinheiro de que preciso. Tenho orgulho de tudo o que meu filho fez (Cristiano Nicolau morreu em acidente de trânsito em 2015): ele ajudava todo o mundo.
O senhor conseguiu realizar todos os seus sonhos?
Sim. Primeiro, Deus me deu saúde. Tenho 72 anos, sempre trabalhei com vontade. Acordava muito cedo, às 4h30min, 5h. Depois, levei um tombo, o pior da minha vida, que foi a perda do meu filho. Só após dois anos, com a família unida, a gente está conseguindo superar. Mas não posso me queixar de nada. Viajo quando quiser, tenho minhas coisas, meus carros, minhas casas.
Já falei para minha esposa: vou doar tudo! Talvez criar alguma organização para ajudar as pessoas que mais precisam.
ORTENILO JOÃO NICOLAU
Ganhador da Mega Sena em 2010
Quantas pessoas o senhor ajudou?
Meu Deus... Primeiramente, a minha família. Dos dois lados, toda a minha família e a da minha mulher. Uma das primeiras coisas que eu fiz foi reunir todos os meus irmãos, cunhados e cunhadas. Ao todo, são 12 pessoas. Eu ainda não tinha assimilado todo aquele dinheiro na minha conta. Mas queria doar um pouco. Então fiz um cheque de R$ 100 mil para cada familiar. Tinha gente ali que ganhava R$ 1 mil por mês... Era tanto zero que eles chegaram a se atrapalhar (risos). Não sabiam direito quanto dinheiro era.
E fora da família?
Ajudo muita gente que eu nem conheço diretamente. Quando ganhei, chamei todos os funcionários do meu frigorífico e dei R$ 10 mil para cada um. Deixei o comando da empresa, mas investi ali muito dinheiro. Fiz questão de não deixar o frigorifico fechar. São mais de 60 funcionários. Sessenta famílias que dependem daquela renda! A igreja de São José do Herval (cidade natal de Ortenilo) precisava de reformas. Eu ajudei e ainda comprei a imagem de um santo, gigante, que custou R$ 58 mil. Também mandei contar quantas crianças menores de oito anos moravam na minha cidade. E dei, ao todo, 486 cestas de Natal. Outro dia, eu recebi uma lista de pedidos de doação para uma escola pública que fica ao lado do meu condomínio no Litoral. Mandei comprar tudo novo para o colégio, deu R$ 56 mil. Juro por Deus: aquelas crianças vieram me abraçar.
É verdade que o senhor comprou uma lotérica só pra poder apostar?
Sim. Comprei uma lotérica em São José do Herval e dei a loja de presente a um familiar. Queria ajudá-lo e também ter um lugar perto da minha antiga casa para poder jogar.
Surgiram muitos aproveitadores?
Sim. Se eu tivesse liberado dinheiro a todos que me procuraram, não tinha mais nada. Chegou gente que eu nem conhecia me dizendo: "O que é pra ti R$ 1 milhão?". E as sugestões: "Por que não compra uma Ferrari?". Eu nunca precisei de Ferrari. Nada de extrapolar!
O senhor nunca fez uma loucura com dinheiro?
Não. Não fiz e não deixei fazerem. Tudo o que eu minha família fazemos com dinheiro é planejado.