Não há momento sem graça que não fique mais interessante embalado pela música certa — assim como não há paraíso sobre a Terra que não se transforme em seu exato oposto ao som de um acompanhamento musical indesejado.
Duas verdades inquestionáveis que testam os limites da civilidade e colocam em conflito diferentes tipos de ética e sensibilidade auditiva. De um lado, os que estão convencidos de que a música alta (a sua música alta) imediatamente instala um clima de alegria e confraternização no ambiente, como se todos em volta, por milagre, compartilhassem os mesmos gostos e estado de espírito. Do outro, os que acreditam que a liberdade do vizinho termina onde começa a sua audição — um dos dois sentidos mais vulneráveis a fatores externos e à falta de noção alheia (o outro é o olfato).
Se os carros com alto-falantes no último volume eram horrendos, mas relativamente escassos, as caixinhas de Bluetooth são portáteis e acessíveis a quase todos os bolsos. Há pelo menos três anos, cada verão que chega é anunciado como "o verão da caixinha", e a tendência parece irreversível. Preparem seus fones de ouvido: a guerra entre os DJs de praia e seus amargurados ouvintes involuntários está apenas começando.
Se o veranista empolgado com a possibilidade de criar seu Carnaval particular no ambiente público não tem nada a perder a não ser o respeito dos vizinhos, os donos de estabelecimentos comerciais que elegem um determinado tipo de música — digamos, invasiva — como trilha sonora do seu negócio correm o sério risco de perder clientes em potencial.
Na semana passada, fui conhecer uma nova área gastronômica em Porto Alegre. Lugar simpático, mesinhas ao ar livre, árvores e, melhor de tudo, perto aqui de casa. Fiz meu pedido, sentei na mesa e fiquei esperando o prato ficar pronto. Tudo teria saído dentro do esperado não fosse a trilha sonora: aquele tipo de música baladeira que talvez funcione para um determinado tipo de público em determinados horários e circunstâncias, mas definitivamente não combina com um almoço de domingo sob as árvores.
Esse tipo de erro de avaliação do gosto musical do suposto público-alvo é comum em diferentes tipos de estabelecimentos de Porto Alegre: academias, bares, restaurantes, salões de beleza... Meu conselho: na dúvida, silêncio ou música de elevador. Não tem erro.