Nas manifestações de 7 de setembro, o bolsonarismo declarou independência do idioma falado no Brasil e consagrou o “inglês de passeata” como sua língua oficial.
Por razões que a própria razão desconhece, os admiradores do presidente Jair Bolsonaro tomaram gosto pelas mensagens escritas no idioma de Shakespeare – ou algo parecido. Sim, muitas vezes as frases não faziam nenhum sentido, político ou gramatical. Um observador chegou a comentar no Twitter que, a julgar pelos cartazes exibidos nas últimas manifestações, a categoria profissional que menos aderiu ao bolsonarismo foi a dos professores de inglês.
Levando-se em conta a gravidade do momento político e as ameaças que continuam pesando sobre as instituições brasileiras e a democracia, slogans como “We want the destitution of STF ministers” (que defende a miséria dos ministros do STF e não sua destituição) e “End of toga dictatorship” (que pede o fim da ditadura das túnicas romanas e não a das togas dos juízes) precisam ser levados muito a sério. Sim, eu sei.
O problema é que a cada pérola do inglês de passeata que desfilava na avenida eu me lembrava de Millôr Fernandes e do seu genial A Vaca Foi pro Brejo/ The Cow Went to the Swamp (Companhia das Letras), coleção de mais de 600 frases que ajudam o brasileiro a “take of letter” (tirar de letra) qualquer emergência internacional. Nesse clássico do humor (voluntário) nacional, você encontra maravilhas como “now is that they are they” (agora é que são elas), “flood fooled” (abobado da enchente) e a sempre útil “illiterate of father and mother” (analfabeto de pai e mãe).
Na mesma linha, o perfil Greengodictionary diverte mais de 1,6 milhão de seguidores postando diariamente no Instagram traduções apatifadas como “it’s just a little remember” (é só uma lembrancinha) e “mary goes with others” (maria vai com as outras). Na semana passada, o Greengodictionary nem precisou trabalhar tanto. O inglês de passeata do 7 de setembro garantiu um bom lote de piadas literalmente prontas, graças ao humor involuntário produzido por traduções malfeitas, falsos cognatos e outros erros grosseiros.
Além de compor frases que não significam nada ou que não serão compreendidas por ninguém que não entenda português (e inglês ruim), o problema do inglês de passeata é que, às vezes, acaba dizendo exatamente o contrário do pretendido. Fica a dica: “Go out Lula!” não significa “fora Lula”, mas algo mais parecido com “vai lá, Lula, relaxa na balada”.