Se Mark Zuckerberg, fundador do Facebook, fosse o Homem-Aranha, este seria o momento em que seu Tio Ben deveria puxar o guri prum canto para proferir uma das mais célebres (e sábias) lições de moral do universo dos quadrinhos: "Com os grandes poderes vêm também as grandes responsabilidades".
Em junho, o Facebook atingiu 2 bilhões de usuários – mais de 25% da população mundial, que chegou a 7,6 bilhões de almas no mesmo mês –, mas a responsabilidade de Zuckerberg diante do seus superpoderes na internet anda mais para Formiga Atômica do que para Homem-Aranha.
As cobranças tornaram-se especialmente intensas nas últimas semanas, depois que a própria empresa admitiu que mais de 10 milhões de usuários da rede social foram expostos a anúncios cuja finalidade era estimular a divisão política nas eleições americanas de 2016. A chapa esquentou ainda mais no último domingo, dia 5, quando as investigações da série de reportagens Paradise Papers revelaram que um empresário ligado ao Kremlin andou investindo na empresa.
Originalmente, o Facebook via a si mesmo (e era visto) como uma força do bem, uma plataforma criada para facilitar a comunicação entre as pessoas e "mudar o mundo" – para usar o jargão preferido de Silicon Valley. Amistosa o suficiente para ser frequentada por avós e seus netinhos, a rede social era também potencialmente revolucionária, com a capacidade de mobilizar forças em torno de causas justas sem a necessidade de intermediários. A imaginação no poder, como sonhavam os jovens rebeldes de 1968.
Nos últimos tempos, porém, o Facebook anda mais parecido com aqueles vilões megalomaníacos que dão gargalhadas macabras enquanto fazem planos para dominar o mundo. Não que Mark Zuckerberg seja uma espécie de Lex Luthor disfarçado de nerd, mas o fato é que ele não tem agido à altura dos seus superpoderes. Talvez lhe faltem as luzes (ou a disposição) para perceber que sua empresa deixou de ser um negócio como outro qualquer, tornando-se uma entidade sem paralelo, em dimensão e influência, na história das relações humanas.
Esse ambiente em que fotos de gatinhos, publicidade e notícias falsas disputam a atenção das pessoas sem que elas percebam que estão sendo manipuladas por algoritmos que nem sequer entendem como funcionam, tem produzido, como subproduto, a erosão do espaço público e da capacidade de convívio com o contraditório. Nada mais justo que sejam cobradas da rede social transparência e algum tipo de regulamentação – e até mesmo que o modelo de negócios seja menos ávido por dinheiro de origem nebulosa.
O Facebook tem se mostrado muito ágil para reconhecer e censurar peitos (mesmo os de mármore...) e para desenvolver algoritmos capazes de antecipar os movimentos de seus usuários. O que se espera agora é que a empresa reaja com a mesma eficiência para combater a desinformação, as notícias falsas, as fraudes e o dinheiro suspeito.