Fui um dos primeiros frequentadores do Twitter no país, abri a minha conta em 2009, três anos depois de sua fundação nos Estados Unidos por Jack Dorsey, Biz Stone, Noah Glass e Evan Williams, o quarteto que revolucionou a comunicação digital com sua proposta de microblogging (“blogar rápido”). Vivíamos o auge dos blogs. O pássaro azul, logotipo do aplicativo, nos incitava a cantar junto — seu nome é para lembrar Twttr ("gorjear"). Havia uma mágica naquele SMS público, um desafio de dizer muito em pouco, em escolher bem as palavras para caber exatamente em 140 caracteres (depois o tamanho dobrou para 280 caracteres).
Eu me senti enfeitiçado pela possibilidade de elaborar aforismos, máximas poéticas. Nunca parei de postar nesses 15 anos, com cinco ou sete mensagens por dia. Tanto que me tornei o primeiro autor brasileiro a reunir uma coletânea de frases feitas no Twitter e publicar em livro.
Experimentávamos uma comunidade viva de notícias, com o recurso do trending topics, ou Assuntos do Momento, notícias ou personalidades mais lembradas. Se você queria descobrir se uma fofoca era verdade, consultava a barra de 20 tópicos mais populares.
Além da possibilidade das hashtags, dispúnhamos de recursos novos como linha do tempo, mensagens diretas e respostas e menções nos tweets.
Com a polarização ideológica das últimas eleições, aquele espaço passou a se tornar mais raivoso, com ataques diretos a qualquer posicionamento aberto. Qualquer um poderia ser linchado em minutos devido às divergências políticas. A ave celeste começou a ser apedrejada. Muitos deixaram de frequentar por uma questão de saúde emocional. A insalubridade da ira converteu o que era bom num quintal do inferno. Aquilo que iniciou com a inofensiva pergunta “o que está pensando?” desandou para a subjetividade pantanosa de “quem você está odiando?”.
Mas resistíamos, procurando adoçar com a ternura de pequenas frases a existência de milícias digitais.
Eu contava com mais de 820 mil seguidores e acompanhava 13 mil perfis. Não permitia ser contaminado pela intransigência, separando os robôs dos humanos a partir da capacidade de interação.
Em 2022, o multimilionário Elon Musk comprou a plataforma por US$ 44 bilhões, e trocou o nome histórico e lendário por uma letra: X.
Os verificados com selo azul teriam que pagar para manter o privilégio, assim como quem não era famoso poderia adquirir a diferenciação.
Em seguida, iniciou-se uma guerra entre Musk e a corte brasileira, em especial com o ministro Alexandre de Moraes, sendo chamado por Musk de ditador.
Era o adeus ao poder ilimitado dessa mídia.
Assim Moraes determinou, na última sexta-feira (30/8), a suspensão do X no Brasil, devido ao "desrespeito à legislação e o reiterado descumprimento de inúmeras decisões judiciais" por parte da plataforma que contraria o Marco Civil da Internet, a legislação de 2014. Nela, empresas que atuam na internet devem ter representantes no Brasil para responder na Justiça pelos atos da empresa. Elon Musk alega que não há representantes, e ainda diz que vai aproveitar para encerrar sua ação no solo brasileiro.
O que não é justo, não entrando em detalhes do imbróglio judicial, é que os nove milhões de usuários ativos no Brasil sejam prejudicados com a decisão, extrapolando a responsabilização dos envolvidos. Tantas pessoas que usam o X para o trabalho ou para suas relações sociais, dos quais me incluo, perderão seus domínios e não fizeram nada de errado, não postaram nenhum preconceito ou ofensa, não agiram com intolerância religiosa, ou com injúria, ou com pornografia. Não violaram os códigos de conduta da comunidade. Tornaram-se invisíveis para a lei, ou uma massa de manobra no meio da negociação.
Quem diz que o mesmo não possa acontecer no futuro com o Facebook, com o Instagram, com o Threads, com o Tiktok? Você somente aprende da pior forma que a conta nunca foi sua.