Quando chegamos do trabalho, tiramos as grifes e colocamos as nossas piores roupas.
Nossas roupas preferidas de casa são sinônimos de vestes de mendigo, de andrajos de construção civil.
Costumamos pôr aquele abrigo molambento furado no joelho, aquela camiseta de vereador que nunca foi eleito, aquela bermuda com elástico solto, aquela meia que virou polaina, aquele chinelo gasto que já sofreu duas cirurgias de reconstrução das tiras.
Tudo sob o pretexto de ficar confortável, de relaxar. Realizamos, inclusive, a incoerente operação de tomar banho para exibir roupas velhas.
E quem é casado conosco que nos aguente. E quem mora conosco que nos suporte.
Não teríamos nem coragem de buscar o jornal com tal sobreposição de misérias, mas não temos vergonha de dividir a intimidade desse jeito, de repartir horas e horas da vida doméstica portando restos do nosso guarda-roupa.
Existe um ideal de que ficar em casa é não se preocupar com a aparência. Até é verdade, mas não precisa exagerar no desleixo a ponto de perder a dignidade.
Sem se dar conta, você veste panos de chão. E ainda quer ser amado, admirado, desejado por quem o acompanha.
No momento de sair de casa e encontrar desconhecidos, desfila com as suas novidades, enquanto separa suas peças mais antigas e destruídas para o contato com os familiares.
Reserva seu melhor vestuário para os estranhos e o seu pior para os íntimos.
Dá de justificativa que não pretende gastar as roupas boas em casa. Como se elas puíssem mais em casa do que na rua. Como se o sofá corrompesse o seu figurino mais do que a cadeira do escritório.
Se fosse assim, nossos pijamas não durariam tanto.
É a ilusão de que você não deve desperdiçar a sua beleza com o par já conquistado. Acredita que o jogo do amor se encontra ganho. Pressupõe que aquele ou aquela que se vê ao seu lado ao longo do tempo já é capaz de perdoar a sua natural má diagramação.
Decidi inverter a ordem. À espera de minha esposa, eu me produzi com um terno, camisa engomada, gravata, sapatos novos e brilhantes. Só faltava sapatear como Fred Astaire. Burilei os fios da barba, ardi a pele do rosto em loção.
Fechei a tranca da porta por dentro para que ela fosse obrigada a tocar a campainha.
Ela apertou uma, duas, três vezes, tudo simultaneamente, talvez furiosa por não conseguir usar a sua chave.
Quando me enxergou, não conteve o espanto. Eu estava na maior beca, alinhado.
Ela me perguntou:
– Vai sair?
Foi nesse instante mágico que eu cochichei no seu ouvido:
– Não, hoje vou namorar.