Sou caxias. Posso chiar, argumentar e reclamar, mas se tem uma regra, eu sigo. Gosto de coisas claras, bem comunicadas. Isso tem o lado bom, mas também o ruim. Preciso abrir a cabeça para flexibilizar o que pode ser flexibilizado e não ficar presa à burocracia de uma regra que talvez já não faça mais sentido. Me incomoda profundamente quando alguém não faz sua parte como deve ou foge de uma combinação. Acredito mesmo que para as coisas funcionarem cada um tem que seguir as leis e fazer o que precisa ser feito.
Acho que é por isso que me irrita tanto quando algo acontece fora das quatro linhas. Tramoias, falcatruas e planos escabrosos, como o do golpe, que vimos sendo desvendado pela Polícia Federal nesta semana, surgem abaixo da superfície, à margem da lei. Há quem diga que tudo se trata de uma armação e que quatro pessoas não matariam presidente e vice eleitos e mais um ministro do Supremo, que não existe golpe sem tanques, ou que não passou de uma conversa entre eles.
Aí entro em outro ponto que considero importante, que é o discurso condizente com a prática. Se você diz que é cristão, não pode achar normal uma conversa sobre matar alguém por não concordar com o resultado de uma eleição, ou por qualquer outro motivo. Antes que você me mande um e-mail ou me chame no Instagram questionando “ah, mas roubar pode”, já digo que é óbvio que é também condenável e também é um dos Dez Mandamentos. Não nivelem o Brasil por baixo elegendo quem errou menos ou achando bom quem “rouba, mas faz”.
Indo um pouco mais a fundo, não gosto da mistura de religião e política. Não à toa o estado é laico. Quer dizer, a liberdade de consciência e crença é um direito e a proteção ao seu livre exercício também, além de haver uma separação administrativa entre Estado e Igreja. Isso não significa que a fé não é importante ou que não se acredita em Deus. Só que se faz isso no lugar correto. Dai a César o que é de César, lembram? Cada coisa em seu lugar.
O segundo mandamento já diz: não tomar seu santo nome em vão. É, para mim, um desrespeito citar Deus para o que quer que seja na política. Para se eleger, para subir ao palanque, para convencer sobre pautas que devem ou não ser debatidas. A partir disso se cria uma ideia de bem contra o mal, que não é verdadeira.
Político que se esconde atrás de Deus para justificar tudo que defende ou faz me deixa absolutamente desconfortável. Isso não é fé verdadeira, mas sim usar da crença de pessoas que de fato acreditam em alguma coisa. Pegando os temas mais sensíveis, como aborto e sexualidade, muitos se aproveitam da boa-fé do cidadão eleitor e misturam as coisas, como se tivessem procuração para defender as pessoas do inimigo que eles mesmos criaram. Precisamos ficar vigilantes, ou acabaremos usados por eles.