Enquanto o Brasil patina para escapar de uma das piores crises econômicas das últimas décadas, produtores capitalizados com sucessivas safras cheias e com o olhar nas próximas colheitas permanecem alheios à recessão.
Dependentes de tecnologia para manter boas produtividades, eles não se permitem parar de investir. Assumem financiamentos para comprar máquinas e equipamentos e se mostram seguros à frente das decisões:
- Tivemos três colheitas recordes seguidas. Os preços das commodities continuam altos. Preciso investir para manter a média dos últimos anos e continuar lucrando - disse Rodolfo Augusto Machado Gonçalves, 55 anos, que veio de São Gabriel até Esteio.
Na Expointer, o produtor comprou um pulverizador por R$ 480 mil pelo programa Moderfrota, com juro anual de 7,5% e prazo de seis anos para pagar. Com o novo equipamento, conseguirá pulverizar até 250 hectares por dia. A máquina antiga, fabricada em 2009, fazia no máximo 90 hectares.
- A agricultura requer agilidade. Em uma semana, a ferrugem pode terminar com a lavoura - exemplifica
Gonçalves, que cultiva 550 hectares de soja na Fronteira Oeste.
Com um trator novo comprado na Expointer passada e o pulverizador na edição deste ano, o produtor renovou toda a frota da propriedade, onde prioriza a agricultura de precisão. A segurança ao investir vem também da venda antecipada de 30% da próxima safra, que ainda nem plantou. Com a cotação do dólar nas alturas, o produtor travou o preço da saca em R$ 75.
Com carteira na mão e ao lado dos filhos, Giticovski veio do Paraná para comprar um pulverizador durante a feira (Foto Caco Konzen, Especial)
A necessidade de tecnologia e o bom momento da agricultura também levaram Gregório Francisco Giticovski, 63 anos, de Rio Negro (PR), a fechar negócio na Expointer. Ele e os dois filhos, Fernando, 33 anos, e Francisco, 31 anos, vieram a Esteio especialmente para comprar um pulverizador, pois precisavam terceirizar o serviço para cobrir toda a lavoura, já que o equipamento antigo não dava conta dos 480 hectares cultivados com soja e milho.
- Se a taxa de juro fosse menor, nós estaríamos comprando uma colheitadeira também. Optamos pelo que era mais urgente - contou Gregório.
Produtores com o perfil de Gonçalves e Giticovski, empresariais e dependentes de tecnologia, contribuem para fazer com que o recuo nas vendas de máquinas e equipamentos agrícolas possa ser menor até o final do ano. De janeiro a agosto deste ano, houve redução de 28,3% em unidades comercializadas em relação a 2014.
A projeção da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) é fechar o ano com queda de 19,4% nas vendas internas, em comparação com o ano passado. O volume de negócios de máquinas na Expointer - R$ 1,69 bilhão, 37,4% menor do que em 2014 - refletiu o momento de retração que toma conta do setor por conta do aumento das taxas de juro, do crédito restrito e da maior cautela dos produtores diante dos custos de produção mais altos.
Apesar do resultado negativo, a Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul) projeta um aumento de 9% nas vendas de máquinas em 2016 e um cenário positivo em médio e longo prazo (veja abaixo), ancorado pela perspectiva de crescimento da safra de grãos.
Sem margem para perdas na safra de verão
Apesar de admitir que o momento é de cautela, Porciuncula comprou trator para acelerar plantio (Foto Caco Konzen, Especial)
Esperando uma primavera chuvosa, por conta da previsão do fenômeno El Niño, o produtor Gesiel Porciuncula, 33 anos, resolveu não arriscar. Com 800 hectares de arroz cultivados em Bagé, e outros 3 mil de soja, o agricultor comprou um trator de 180 cavalos para afastar o risco de atraso no plantio.
- Talvez o momento ideal para investir não seja esse. Mas a janela de plantio está cada vez mais curta, precisamos ser rápidos - contou Porciuncula, que financiou o trator de R$ 225 mil.
O novo equipamento irá se juntar a outros 22 tratores e sete colheitadeiras da propriedade. Com produção altamente tecnificada, Porciuncula espera colher média de 185 sacas por hectare de arroz e 50 sacas por hectare de soja.
- Não temos mais espaço para erros. Não posso correr o risco de baixar a produção por falta de investimentos - afirmou o produtor.
Fabricante de equipamentos voltados à agricultura de precisão, como pulverizadores, a Stara aposta nesse perfil de cliente para manter as vendas.
- Se a tecnologia representar aumento de produção, o agricultor seguirá investindo - destaca Jeferson Stieven, gerente comercial da Stara na Região Sul.
Os lançamentos da John Deere também enfocaram o aumento da produtividade, como menos perdas na colheita.
- Estamos indo ao encontro das necessidades dos produtores - enfatizou Tangleder Lambrecht, gerente regional de vendas da marca, que oferece serviços pós-venda para capacitar o produtor ou o funcionário a explorar ao máximo a tecnologia das máquinas.
Tudo para fisgar os clientes
Foto Caco Konzen, Especial
Ao passar pelos estandes de máquinas e equipamentos agrícolas na 38ª Expointer, era possível perceber que a feira seria diferente dos últimos anos. Com um número menor de visitantes, muitos deles apenas olhando sem a intenção concreta de compra, as marcas tiveram de se reinventar para fisgar clientes. Até show de máquinas, em uma arena com arquibancada e música, foi usada como chamarisco.
- Em momentos de retração, é preciso oferecer experiências diferentes aos clientes. A idade da frota de tratores e colheitadeiras no Brasil ainda é antiga. Há muito espaço para ocupar - avalia Alexandre Blasi, diretor comercial no Brasil da New Holland, marca que promoveu espetáculos diários com tratores, pulverizadores e retroescadeiras.
Na tentativa de atrair compradores em época de economia retraída, a Massey Ferguson readequou um modelo de trator para lançar na feira com preço menor. O veículo de 75 cavalos, que antes era vendido por R$ 90 mil, passou a custar R$ 73 mil sem a inclusão de alguns acessórios.
- Mudamos algumas especificações do produto para torná-lo mais atrativo ao bolso do produtor - explica Leonel Oliveira, gerente de vendas da Massey Ferguson no Brasil.
Outra estratégia usada pelas fabricantes foi o barter, operação em que o produtor pôde comprar o equipamento agora e pagar com grão a ser colhido na próxima safra.
- Esse tipo de operação vem crescendo, pois não precisa desembolso imediato do produtor, que garante a compra com sua produção - explica Blasi, acrescentando que a modalidade consórcio também está ganhando espaço.
* Zero Hora