Economista do Departamento de Agricultura americano (USDA, na sigla em inglês), Warren P. Preston está no Brasil para participar do 7º Congresso Brasileiro de Soja e do 6º Mercosoja, que começou segunda-feira e vai até quinta em Florianópolis (SC).
Em entrevista exclusiva, Preston disse que Brasil e EUA não devem ser rivais e ressaltou que ter mais área para grãos é a maior vantagem competitiva do Brasil. Veja a seguir, os principais trechos:
Como analisa a sequência de safras recordes de grãos do Brasil nos últimos anos?
O salto do Brasil em soja e milho se deu em um momento de crescente demanda por parte da China, avanço da produção de biocombustíveis, nos Estados Unidos e em outros países, e cenário favorável diante de problemas climáticos que limitaram a produção de milho americana. O Brasil aumentou a sua participação preenchendo o vazio deixado pelos EUA.
Como grandes produtores, Brasil e EUA são mais concorrentes ou parceiros?
A diferença na época de plantio faz com que os calendários de exportação não coincidam. Mas quando um produz safra recorde, a temporada de exportação pode se estender mais do que o normal e afetar os negócios e preços para o outro. Em geral, com a China sendo um grande importador de soja o ano todo, Brasil e EUA efetivamente trabalham como parceiros.
Até que ponto a dependência da soja pode ser um risco?
Percebemos que o Brasil está expandindo sua produção. Esta situação tem sido semelhante nos EUA. Mas ambos têm condições para atender a demanda por grãos sem causar prejuízo a outros setores, como a pecuária.
Como você avalia a expansão crescente do mercado chinês nos últimos anos?
Nos últimos 10 anos, o Brasil tornou-se mais dependente da China no mercado de soja, com negócios passando de cerca de 30% para mais de 70%. No caso dos EUA, a história é a quase a mesma: de 35% para cerca de 60%. Daqui para frente, no nosso caso, há limitações para expansão, principalmente de área para cultivo. Com isso, os ganhos terão de ser impulsionados pela maior produtividade.
Qual sua análise sobre o papel cada vez mais crescente da tecnologia no campo?
Os ganhos de produtividade no Brasil são muito semelhantes aos dos EUA. As melhorias em genética, manejo e máquinas foram muito importantes. Este crescimento tem colocado pressão adicional sobre a infraestrutura de transporte, mas aqui têm ocorrido investimentos em armazenamento e logística para atender à demanda.
A logística é um dos maiores entraves no Brasil. Qual importância tem no desempenho da agricultura americana?
Investimentos públicos e privados na logística de grãos dos EUA têm mantido os custos de transporte baixos e garantido competitividade na produção de grãos e nas exportações.
O preço da soja caiu e, no Brasil, isso foi compensado pela desvalorização do real. Qual foi o impacto nos EUA?
No último ano, o preço da soja caiu cerca de 30%. Poderia se esperar que a área cairia nos EUA, mas o preço da soja sozinho não é o único fator levado em conta pelo produtor, e parece que aqui atingiremos novo recorde. Para o Brasil, espera-se um pequeno aumento na área no próximo ciclo, já que a soja ainda é a melhor alternativa de renda.
O que se pode projetar para o futuro da soja em 10 anos?
A produção do Brasil deve aumentar de 94,5 milhões de toneladas para cerca de 129 milhões de toneladas em 2024/25 - crescimento de 3% ao ano. Este avanço deve vir do crescimento em área (2% ao ano) e produtividade (1,2%). Hoje, o Brasil responde por 30% da produção mundial, o que deve subir para 35% em 10 anos. Os principais mercados devem ser China e leste e sudeste asiático. Os principais produtores continuarão sendo Brasil, Argentina, Paraguai, EUA, Índia e China.
Como analisa o potencial do Brasil no mercado de carnes?
Exigências sanitárias continuam a ser uma preocupação para todos os países, especialmente para bovinos e aves. A capacidade do Brasil de produzir grandes quantidades de farelo de soja e grãos faz com que a expansão da produção de ração avance e ajude a alavancar as exportações. Obstáculos sanitários serão só um dos muitos desafios que terão de ser discutidos por meio de negociações e de mudanças nas práticas industriais.
O Brasil vive um ajuste econômico. Qual foi o efeito da crise de 2008 nos EUA e como atingiu o agronegócio?
Por causa da alta no valor das commodities agrícolas de 2006 até 2013, do crescimento da produtividade e da valorização no preço das terras, muitos produtores americanos não foram largamente afetados pela crise. Desde então, o USDA fez uma transição nos programas e políticas agrícolas, mudando o foco para garantir a proteção de receitas, incluindo seguro agrícola.
Produzir alimentos será o grande desafio mundial. Como suprir esta necessidade?
As melhorias na tecnologia e a oportunidade de destinar mais terra à agricultura em países como Brasil e Indonésia permitirão ao mundo superar este desafio. Mas será importante que a pesquisa siga ajudando a garantir melhor produtividade e variedade de sementes, além de políticas de equilíbrio ambiental e melhor infraestrutura.
Como projeta o impacto das mudanças climáticas nos resultados do agronegócio?
Em 2013, relatório do USDA concluiu que o aumento na temperatura e da chuva reduzirão a produtividade das culturas e impactarão na produção de animais. E apontou que novas estratégias de gestão, maior conhecimento meteorológico e desenvolvimento de sistemas integrados ajudarão a sustentar a produção agrícola.
Que lições o Brasil pode dar aos EUA e vice-versa?
Brasil e EUA têm muito em comum e podem aprender um com o outro. Temos agricultores produtivos e fortes sistemas de pesquisa agrícola. Como os dois países se esforçam para aumentar produtividade, certamente se beneficiarão diante do aumento da demanda e do consumo no mundo.