A violência no clima testemunhada pelos gaúchos nos últimos meses não caiu do céu como a chuva torrencial que devastou cidades ao longo das margens do Rio Taquari. Há mais de uma década, já havia sinais claros de que o Rio Grande do Sul passaria a conviver com temperaturas cada vez mais altas, tempestades mais violentas e chuvas mais caudalosas. Os alertas da meteorologia, porém, não geraram ações capazes de evitar as tragédias atuais.
Em 2011, de forma semelhante ao que se viu agora, uma supertempestade deixou 12 vítimas durante o feriadão da Páscoa em áreas como os vales do Taquari (também afetado desta vez), do Sinos e do Paranhana e reforçou suspeitas de que havia algo diferente nos céus do Estado. Uma série de estudos disponíveis à época, compilados em uma reportagem de Zero Hora, comprovava essa impressão: até aquele momento, a média de chuva nos últimos 30 anos havia aumentado 8,4% em comparação aos 30 anos anteriores, e os termômetros estavam 0,5ºC mais quentes do que meio século antes.
— Estamos vendo agora o que já vinha acontecendo naquela época — afirma o climatologista da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Francisco Eliseu Aquino, que figurava entre os autores de alguns dos trabalhos que já revelavam a transformação no clima do Estado.
Logo depois da tragédia verificada naquele ano, Aquino já avisava: "mais calor e mais umidade contribuem para um número maior de eventos severos como tempestades, já que funcionam como combustíveis para elas". E completava: "se a pergunta é se o clima gaúcho está mudando, a resposta é sim".
Também já havia indícios claros de que os temporais vinham ganhando violência em ritmo acelerado: no período de 2000 a 2009, havia sido registrada uma disparada de 71% na ocorrência de trovoadas nas regiões do aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, e da Base Aérea de Canoas, em relação aos 10 anos anteriores. Ainda não havia grande certeza sobre as razões para essas mudanças de cenário, mas o aquecimento percebido em nível global já era elencado como um dos fatores mais prováveis, além de outras hipóteses como variações na circulação dos ventos próximos à Antártica.
O resultado da combinação explosiva de mais calor e umidade sobre o Estado, pouco mais de uma década atrás, já havia provocado consternação semelhante à atual em razão da morte de 12 gaúchos em um único evento — algo, até hoje, poucas vezes visto.
Dessas vítimas, sete eram do município de Igrejinha, onde foram velados de forma coletiva no Parque da Oktoberfest. A expectativa de que o trauma experimentado naquela época resultasse em ações capazes de prevenir novas catástrofes, porém, ao contrário dos prognósticos meteorológicos, não se confirmou.