Nesta semana, viralizou na internet vídeo que mostra como é viver na "cidade mais úmida do Brasil". Foi preciso apenas algumas cenas de paredes escorrendo e de alimentos, móveis e cômodos da casa mofados para os pelotenses reconhecerem: o vídeo é sobre Pelotas, na região sul do Estado. Que a cidade tem muita umidade é verdade, mas o título de mais úmida no país é mito.
É impossível saber com certeza quando Pelotas recebeu a fama de cidade mais úmida do Brasil. Alguns boatos que correm no município, inclusive, defendem que a cidade é a segunda mais úmida do mundo, ficando atrás apenas de Londres. A verdade, porém, é que dezenas cidades podem ser consideradas mais úmidas que Pelotas, tanto no Rio Grande do Sul quanto no resto do país.
— Estou há seis anos aqui e escuto que Pelotas é a cidade mais úmida do país desde o primeiro dia. Minha surpresa foi enorme ao ver meus vídeos sobre a umidade conquistarem milhões de visualizações no TikTok, com comentários de várias pessoas relatando os mesmos problemas — afirma o estudante Matheus Pereira, 26 anos, que gravou os vídeos sobre a rotina dos moradores da cidade.
Segundo a meteorologista e professora da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) Eliana Klering, a localização geográfica torna a cidade mais favorável ao suprimento de umidade. A hidrografia local e a baixa intensidade dos ventos fazem com que a umidade seja mais presente na vida dos pelotenses.
— Mas Rio Grande e Torres, por exemplo, são mais úmidos que Pelotas. Se analisarmos a média climatológica de 1991 a 2020, a média mensal dos níveis de umidade em Rio Grande são de 86% para junho, 85% para julho e 84% para agosto. Enquanto em Pelotas, no mesmo período, as médias são de 85,8% para junho, 84,7% para julho e 84,1% para agosto.
Outras regiões do Brasil também apresentam níveis acima dos 80% de umidade. De acordo com dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), nesta quarta-feira (2), cidades de São Paulo, Mato Grosso e Bahia chegaram aos 100% de umidade.
— O suprimento de umidade é o que a hidrografia nos fornece. Em Pelotas, tem a Lagoa dos Patos, o Arroio Pelotas e a proximidade com o oceano que contribuem. Na região amazônica, por exemplo, a umidade é elevadíssima por causa do rio e da transpiração das plantas da floresta — explica Eliana.
Não existe, porém, um estudo que aponte quais níveis de umidade podem ser considerados normais para saber se Pelotas está muito ou pouco acima da média. Em Porto Alegre, porém, os níveis desta quarta-feira chegaram a 88%, enquanto os de Pelotas bateram os 96%.
— Esse mito de Pelotas é muito antigo, e nós sempre desmentimos. Quando entrei na faculdade, em 1999, os meus colegas levantavam a mão em sala de aula para perguntar se realmente era a cidade mais úmida do Brasil — acrescenta a especialista.
Riscos para a saúde
Uma série de doenças e condições de saúde podem ser agravadas por conta da alta umidade. Para quem já tem doenças respiratórias, a umidade do ar pode significar mais episódios de tosse e espirro, por exemplo. Além de aumentar o nível de proliferação de vírus e bactérias.
— Tanto o tempo seco, quanto o tempo úmido, podem ser danosos para o organismo. Mas quando está seco, conseguimos umidificar o ambiente. Agora, quando está úmido, não tem o que fazer. Muitas pessoas fecham a casa e ligam a lareira, só que isso pode fazer mal à saúde, uma vez que as fuligens podem grudar nas vias aéreas — alerta Liana Corrêa, pneumologista do Hospital São Lucas da Pontifícia Universidade Católica (PUCRS).
A especialista também chama atenção para o mofo, um problema causado pelo excesso de umidade. A condição, muito comum de afetar paredes, teto e móveis, pode provocar ou complicar quadros alérgicos.
O mofo é algo que aparece no vídeo feito por Matheus Pereira, uma dificuldade frequente segundo ele:
— No vídeo, destaquei o antigo prédio público do Banco do Brasil, que está se deteriorando devido a vários fatores, incluindo a umidade. Lutar contra esse problema no inverno é cansativo, já que o mofo surge mesmo em espaços bem ventilados e ensolarados, dificultando especialmente a vida de quem tem problemas respiratórios.
*Produção: Yasmim Girardi