A Agência Espacial Europeia (ESA) anunciou, nesta quarta-feira (23), durante evento realizado em Paris, na França, o nome do ex-atleta paraolímpico britânico John Mcfall, 48 anos, como o primeiro astronauta com deficiência física do mundo. Essa nomeação faz parte do projeto de Viabilidade de Parastronautas, que pretende recrutar deficientes físicos para o posto.
Além do britânico, a ESA convocou cinco astronautas de carreira e 11 reservistas. Até o momento, Mcfall é o único dos novos recrutados que tem deficiência, mas a ideia é que com o avanço do projeto da ESA, aumente a inclusão nos próximos processos seletivos.
O ex-atleta treinará junto com os outros nomeados e participará de um estudo de viabilidade que tem como objetivo avaliar as condições necessárias para que pessoas com deficiência física possam participar de futuras missões espaciais e voos tripulados.
Em entrevista ao site da ESA, o britânico revelou que assim que viu o anúncio da vaga decidiu concorrer pelo "desafio e pela aliciante oportunidade". Agora, aprovado, John contou que está muito feliz e ansioso para realizar atividades que jamais cogitou serem possíveis devido a sua condição.
— Tem sido uma experiência bastante turbulenta, já que como amputado, nunca pensei que ser uma astronauta fosse uma possibilidade. Então, a empolgação foi uma emoção enorme — relembrou.
O processo seletivo
A seleção de novos astronautas da ESA foi anunciada em fevereiro do ano passado. Diferentemente dos processos seletivos anteriores, esse foi o primeiro a aceitar a inscrição de pessoas com deficiência física.
Desde o início da divulgação da seleção, a ESA esclareceu que só selecionaria um ou mais candidatos cuja deficiência física fosse nas extremidades inferiores — por amputação ou malformação congênita. Pessoas com 1,30 metros de altura e com pernas assimétricas também foram elegíveis no processo seletivo.
— O projeto de Viabilidade de Parastronautas requer uma mudança completa de filosofia sobre a aptidão médica, um conceito de origem militar destinado a selecionar pilotos de combate — explicou Guillaume Weerts, médico-chefe dos astronautas da ESA, à AFP.
Durante a seleção, os candidatos se submeteram a testes psicológicos e cognitivos. Segundo dados da Agência Espacial Europeia, o processo seletivo contou com 257 inscrições de pessoas com deficiência física.
— Lidamos com um grande grupo de candidatos e conhecemos pessoas incríveis. O processo demonstrou que a deficiência não é uma limitação — acrescentou Weerts à AFP.
Os aprovados
Ao todo, 17 pessoas foram aprovadas no mais recente processo seletivo para astronautas da ESA. Desse total, cinco são profissionais de carreira, 11 ficaram como membros reserva e John Mcfall ficou com a única vaga de parastronauta.
Confira a lista completa dos selecionados:
- Aleš Svoboda (República Tcheca): membro da reserva de astronautas
- Amélie Schoenenald (Alemanha): membro da reserva de astronautas
- Andrea Patassa (Itália): membro da reserva de astronautas
- Anthea Comellini (Itália): membro da reserva de astronautas
- Arnaud Prost (França): membro da reserva de astronautas
- Carmen Possnig (Áustria): membro da reserva de astronautas
- John Mcfall (Reino Unido): membro do estudo de viabilidade parastronauta
- Marco Sieber (Suíça): astronauta de carreira
- Marcus Wandt (Suécia): membro da reserva de astronautas
- Meganne Christian (Reino Unido): membro da reserva de astronautas
- Nicola Winter (Alemanha): membro da reserva de astronautas
- Pablo Álvarez Fernández (Espanha): astronauta de carreira
- Raphaël Liégeois (Bélgica): astronauta de carreira
- Rosemary Coogan (Reino Unido): astronauta de carreira
- Sara Garcia Alonso (Espanha): membro da reserva de astronautas
- Sławosz Uznański (Polônia): membro da reserva de astronautas
- Sophie Adenot (França): astronauta de carreira
O projeto para parastronautas
O projeto de Viabilidade de Parastronautas pretende encontrar maneiras de tornar viável e segura a realização de missões espaciais e voos tripulados com pessoas com deficiência física. Para isso, John Mcfall irá realizar uma série de testes que serão avaliados e aprimorados pela ESA.
O médico-chefe dos astronautas da ESA revelou que a equipe envolvida no projeto prevê que na próxima década já seja possível levar ao espaço a primeira pessoa com deficiência física.
— O calendário é difícil de prever porque depende muito do que encontrarmos. Potencialmente, um astronauta com necessidades especiais poderá ser enviado ao espaço nos próximos 10 anos — explicou Guillaume Weerts.
Para Kamran Mallick, diretor-geral da instituição de caridade britânica Disability Rights UK e deficiente físico, essa iniciativa pode trazer grandes mudanças ao inserir as pessoas com deficiência em postos e ambientes em que elas são excluídas diariamente.
— O projeto é incrivelmente emocionante, já que as pessoas com deficiência são deixadas de fora de tantas coisas boas que a humanidade faz. Se queremos explorar o Universo, temos que aceitar que a aventura não pode ser reservada apenas para um determinado grupo de indivíduos — disse Mallick.
O diretor-geral da Disability Rights UK também defende que as pessoas com deficiência lutem contra o capacitismo, ou seja, atitudes e pensamentos discriminatórios que tentam limitar as atividades que deficientes são ou não capazes de realizar.
— Estou em uma cadeira de rodas e é muito melhor quando as pessoas me perguntam o que funciona para mim, do que preciso, em vez de fazer suposições sobre o que alguém pode, ou não, fazer — declarou.
Mallick também revelou que quando mais jovem sonhava em ser astronauta, mas que muitas pessoas o desestimularam e não acreditavam que conseguiria atuar nessa área.
— Rapidamente me garantiram que isso não aconteceria. "Você não deve aspirar a ser um astronauta", me disseram. Hoje me arrependo de não ter perseguido meu sonho — contou.
Quem é John Mcfall
O britânico John Mcfall é casado, tem três filhos e exerce a profissão de médico. Ele ficou conhecido na mídia devido a sua atuação como atleta paraolímpico. Entre suas conquistas no esporte, destaca-se a medalha de bronze nos 100 metros dos Jogos Paraolímpicos de Pequim, em 2008.
Mcfall teve sua perna direita amputada aos 19 anos após um acidente de motocicleta. Essa situação, que mudou completamente sua vida, fez com que desistisse de seu sonho de iniciar uma carreira militar.
Com novas metas e objetivos, John decidiu estudar ciências e esporte no País de Gales. Nessa mesma época, conseguiu colocar uma prótese, o que o motivou a ingressar em competições paraolímpicas de corrida.