Que tal ir de Porto Alegre a Florianópolis em 20 minutos? Com uma tecnologia que parece saída de uma fábula futurista, essa viagem pode não estar tão distante. Chamado de hyperloop, o invento é um meio de transporte com cápsulas que passam ligeiras por tubos metálicos, isso quase no vácuo. E tudo poderia funcionar à base de energia renovável, sobretudo painéis solares.
O bilionário Elon Musk, dono da SpaceX (de viagens espaciais e transportes) e da Tesla (veículos elétricos) e metido em outras mil estripulias tecnológicas — uma de suas últimas modas é a parceria com a Neuralink, empresa que quer desenvolver implantes cerebrais capazes de fazer o homem se comunicar com máquinas — promoveu um concurso para desenvolver a nova tecnologia.
O hyperloop, certa vez resumiu Musk, seria um cruzamento entre um canhão eletromagnético, um avião Concorde e uma mesa de hóquei de ar.
O inventor brasileiro
O estudante de engenharia mecânica Rafael Nass de Andrade, 23 anos, demorava o triplo do tempo para chegar à Universidade de São Paulo (USP) - até uma hora no carro em dias de trânsito - do que o potencial do hyperloop em percorrer entre as capitais gaúcha e catarinense.
Hoje ele vai de bicicleta à alemã Universidade Técnica de Munique (TUM), como parte de um programa de duplo diploma com a faculdade brasileira. E foi ali que seu caminho cruzou com o de Musk.
Nass foi um quatro líderes do time com 50 pessoas que venceu, em julho, uma competição universitária criada pelo magnata para dar um empurrãozinho do espírito competitivo acerca da nova tecnologia.
Em dezembro, Musk convocou a imprensa para ir até Hawthorne, subúrbio do condado de Los Angeles com 90 mil pessoas. Lá ficam as sedes da SpaceX e da The Boring Company, companhia focada em túneis que ele fundou em 2016, após reclamar que o trânsito local o "deixa louco".
Não à toa, veículos como o The New York Times cravaram sobre aquele dia: "É hora do show para Elon Musk, mas ainda falta muito para chegar lá".
Invento deve ultrapassar os 1.000 km/h
O empresário revelou um trecho subterrâneo já construído do que seria "um passo em direção ao hyperloop". O sistema, chamado apenas de loop, deveria transportar 16 pessoas em cápsulas elétricas, em velocidades mais lentas do que o hyper. Para a demonstração, acabou usando automóveis elétricos da Tesla, num ritmo de 80 km/h.
O hyperloop pode, ao menos em tese, ultrapassar os 1.000 km/h, um pouco abaixo da velocidade do som (1.224 km/h) e bem superior à média dos trens-bala mais rápidos do mundo (400 km/h).
Ainda falta um bocado para se aproximar da passada sonora. Nass conta que sua equipe venceu o torneio de Musk "quebrando o recorde de velocidade": atingiram 482 km/h.
Nós, uma vez, estimamos cerca de R$ 0,40/km para o consumidor final nos primeiros anos
RAFAEL NASS DE ANDRADE, 23 ANOS
Quase cinco vezes mais célere, é verdade, do que sua faculdade conseguiu na primeira edição, em 2015. De novo, havia uma brasileira liderando o grupo da TUM: Mariana Avezum, 29, que hoje faz doutorado em mobilidade urbana com ciência da computação na universidade.
— Por razões técnicas, que estavam além do nosso controle, a velocidade máxima naquela competição foi 94km/h —, diz Avezum.
Os protótipos estudantis deste ano levitavam ou usaram rodas, e seus criadores os testaram no tubo hermético aberto pela Boring Company, cujo nome em português pode ser traduzido como "entediante".
Brasil não deve ser o primeiro país a receber o invento
Nada enfadonho, contudo, é o clima competitivo, afirma Nass:
—Só existia um critério para vencer: atingir a maior velocidade possível e depois frear com sucesso.
Caso seja mesmo viável um dia, o hyperloop se daria melhor no Brasil do que em outros cantos do chamado primeiro mundo, acredita o universitário.
— Por incrível que pareça acho mais difícil essa tecnologia ser aplicada na Europa, onde a infraestrutura de transporte é bem completa. E o hyperloop teria que substituir uma existente linha de trem. O Brasil levaria vantagem por ter um sistema ferroviário mais precário — diz ele, que segue:
— Mas creio que a primeira linha será na Índia, na China ou nos Emirados Árabes Unidos. Eles têm um incrível poder econômico e tentam mostrar para o mundo que são países do futuro, e ao mesmo tempo a infraestrutura de transportes deles ainda tem grande potencial de melhoria.
Estimativas de preço? Isso varia. Musk já disse que viagens com a tecnologia poderiam custar US$ 1 (cerca de R$ 4). Outra companhia que desenvolve o sistema, a Virgin Hyperloop, diz que "é difícil precisar, pois dependerá da rota, mas a meta é fazer com que seja acessível".
— Nós, uma vez, estimamos cerca de R$ 0,40/km para o consumidor final nos primeiros anos — afirma Nass.
Formato dos veículos é outro ponto aberto a discussão. Os mais buscados pelas empresas: cápsulas capazes de acomodar mais ou menos a mesma quantidade de pessoas que um ônibus.
— Um conceito um pouco mais alternativo, e que eu particularmente gosto, é o de cápsulas para um ou dois passageiros, onde eles viajam praticamente deitados. Com isso o diâmetro do tubo diminuiu muito, reduzindo custos de infraestrutura e permitindo instalar o sistema dentro de grandes cidades — acredita Nass.