O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta terça-feira (1º) o julgamento que deve proibir o uso da tese de legítima defesa da honra para justificar a absolvição de condenados por feminicídio. A sessão está prevista para as 14h.
Antes do recesso, o plenário já havia formado maioria de seis votos para impedir que a tese possa ser utilizada como argumento de defesa por advogados de réus ou para justificar absolvição pelo Tribunal do Júri.
O relator, Dias Toffoli, foi seguido pelos ministros André Mendonça, Alexandre de Moraes, Nunes Marques, Luís Roberto Barroso e Luiz Edson Fachin. Ainda faltam os votos dos ministros Gilmar Mendes, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Rosa Weber.
O STF julga uma ação protocolada pelo PDT em 2021 para impedir a absolvição de homens acusados de homicídio contra mulheres com base no argumento de que o crime teria sido cometido por razões emocionais, como uma traição conjugal, por exemplo.
No Supremo, a maioria foi formada na sessão de 30 de junho, antes do recesso de julho. Na época, a presidente do tribunal, Rosa Weber, comentou que o país tem histórico de normas que chancelaram a violência contra a mulher.
— A mulher era uma coisa, era uma propriedade, por isso podia ser morta para lavar a honra do marido — afirmou na ocasião.
Histórico
Entre 1605 e 1830, foi permitido ao homem que tivesse sua "honra lesada" por adultério agir com violência contra a mulher. Nos anos seguintes, entre 1830 e 1890, normas penais da época deixaram de permitir o assassinato, mas mantiveram o adultério como crime.
Somente no Código Penal de 1940, a absolvição de acusados que cometeram crime sob a influência de emoção ou paixão deixou de existir. Contudo, a tese continua a ser utilizada pela defesa de acusados para defender a inocência.
A decisão do Supremo possui repercussão geral e terá impacto em 79 processos sobre a mesma questão no país.
Caso Ângela Diniz
Um dos casos mais notórios envolvendo a tese da "legítima defesa da honra" é o assassinato da socialite Ângela Diniz, em 1976, em uma casa de veraneio na Praia dos Ossos, em Búzios, no Rio de Janeiro.
No dia em que foi morta, ela havia decidido encerrar o relacionamento com Raul Fernando do Amaral Street, conhecido como Doca Street. Inconformado, ele foi até o carro, pegou uma arma e atirou quatro vezes contra o rosto da mulher.
O julgamento do caso aconteceu apenas em 1979. Doca Street foi representado pelo renomado advogado Evandro Lins e Silva, que usou como tese de defesa a "legítima defesa da honra". Para convencer o júri, afirmou que Ângela Diniz era uma "mulher fatal", capaz de levar qualquer homem à loucura.
Doca acabou condenado a apenas dois anos de prisão, que pôde responder em liberdade. A sentença branda, contudo, mobilizou o movimento feminista.
Graças aos protestos, ele foi levado novamente a julgamento em 1981. Dessa vez, foi condenado a 15 anos de prisão por homicídio. Ele cumpriu apenas quatro em regime fechado. Depois, progrediu para o semiaberto e acabou solto em 1987. Doca morreu em 2020, aos 86 anos.