Até o fim deste mês, a Polícia Civil espera concluir a investigação de um caso estarrecedor em Alvorada, na Região Metropolitana. Quatro crianças foram encontradas mortas dentro da casa do pai no bairro Piratini, três delas com golpes de faca. O crime foi descoberto no fim da tarde de 13 de dezembro. Suspeito de ter assassinado os filhos, David da Silva Lemos, 28 anos, foi preso horas depois em Porto Alegre.
À frente da Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) de Alvorada, o delegado Edimar Machado afirma que praticamente todas as etapas que poderiam ser cumpridas pela Polícia Civil na apuração do caso estão concluídas. Foram ouvidas testemunhas, como vizinhos e pessoas próximas do casal, além de familiares das vítimas. Entre eles, a avó paterna, que foi quem localizou os corpos dos netos.
Yasmin, 11 anos, Donavan, oito, Giovanna, seis, e Kimberly, três, foram encontrados mortos dentro da casa do pai — os três primeiros tinham marcas de golpes de faca.
A polícia também ouviu durante a investigação a mãe das crianças. Thays Antunes, 26 anos, relatou que quando aconteceu o crime estava separada havia alguns meses do companheiro, pai das três meninas e do menino, e que já havia sido vítima de violência doméstica.
A mulher tinha medida protetiva contra o ex, mas a ordem judicial não se estendia às crianças. Em depoimento, a mãe negou que tivesse havido algum episódio anterior de violência do pai contra os filhos, mas relatou que ele não aceitava o fim do relacionamento.
A polícia acredita que foi esse contexto que levou Lemos a assassinar os quatro filhos. O crime teria acontecido no fim da tarde de 12 de dezembro. As crianças tinham passado o fim de semana na casa do pai e da avó paterna, que ficava no mesmo pátio. Naquela segunda-feira deveriam ter retornado para a mãe, que estava residindo em Porto Alegre, mas isso não aconteceu. No fim de dezembro, Lemos foi interrogado novamente pela polícia.
— Ele se recusou a detalhar como foi o crime, mas fica claro, no contexto, que foi o autor. Ele não aceitava a separação e se sentia traído — afirma o delegado.
Em relato anterior à polícia, informalmente, o pai disse que teria usado chá para fazer os filhos dormirem — isso ainda não foi confirmado. Depois disso, teria assassinado três deles com golpes de faca dentro de casa, e asfixiado a caçula.
Agora, a polícia aguarda a conclusão de perícias, que poderão indicar, por exemplo, se realmente foi usado algum sedativo nas vítimas, conforme o delegado.
Perícias em fase final
Segundo o Instituto-Geral de Perícias (IGP), foram solicitadas total de 47 análises referentes ao caso, sendo 23 delas da área de toxicologia, que deve responder se havia alguma substância sedativa no corpo das crianças. De todas as perícias, 19 estão concluídas, entre elas a análise de impressões digitais e a que verificou a possibilidade de presença de álcool etílico nas vítimas.
Entre as perícias que ainda estão pendentes, estão, além dos demais resultados toxicológicos, os laudos de necropsia, que devem apontar as causas das mortes (dependem de respostas da toxicologia), e a análise de uma faca, apreendida dentro da residência com vestígios de sangue. Uma das possibilidades com esta última perícia é buscar material genético do próprio pai na faca, que pode ter sido usada no crime. Ainda conforme o IGP, as perícias estão em fase final e devem ser concluídas em breve.
Premeditação
Outra resposta que a polícia espera obter ainda é sobre a possível premeditação do crime. Quando foi interrogado, Lemos negou que tenha planejado assassinar os próprios filhos.
— Ele alegou que teve uma espécie de surto — diz o delegado.
A polícia espera autorização judicial para conseguir analisar os celulares que foram apreendidos com o suspeito. Dois aparelhos foram recolhidos com o próprio preso, que foi localizado pela Brigada Militar na recepção de um hotel nas proximidades da Estação Rodoviária de Porto Alegre. Um terceiro celular foi entregue à polícia pelo funcionário de um bar na Orla. O suspeito teria estado no local após o crime, consumido bebida alcoólica, e ao deixar o estabelecimento teria esquecido o telefone e os documentos no local.
Com a análise desses celulares, a polícia espera conferir, por exemplo, se o pai realizou algum tipo de pesquisa anterior na internet que indique premeditação, ou se houve alguma troca de mensagens referente ao crime. A polícia não descarta tentar realizar um novo interrogatório do pai, em busca de mais detalhes do caso. Lemos continua preso de forma preventiva.
Contraponto
O que diz a defesa de David da Silva Lemos
A Defensoria Pública do Estado se manifestou sobre o caso, informando que o suspeito segue sendo defendido pela instituição, como forma de “garantia da plena defesa do contraditório”, e que neste momento aguarda a conclusão do inquérito e posterior envio ao Ministério Público. A DPE já havia informado que só deve se manifestar sobre o caso nos autos do processo.