A disputa de território pelo tráfico de drogas entre dois grupos criminosos locais é apontada pela polícia como principal fator para explicar as cinco mortes em um período de cinco dias na Vila Farrapos. Em dois dos casos, os alvos foram alvejados por dezenas de disparos — as outras duas mortes aconteceram em confronto com a Brigada Militar (BM). Armas e munição foram apreendidas e o policiamento foi reforçado na comunidade localizada na zona norte de Porto Alegre.
A área que vem gerando os conflitos registrados nos últimos dias está concentrada no Loteamento Liberdade Mario Quintana. Foi ali que na noite de sexta-feira (16) dois jovens foram executados com dezenas de disparos. Pouco antes da morte, um deles, Vitor de Lima Oliveira, 19 anos, teria se envolvido em uma discussão. A polícia ainda não se sabe se os dois eram o alvo, ou se João Manuel Goulart, 24 anos, acabou morto por estar junto no local.
— Estamos com a investigação bem avançada. Sabemos que eles estavam em via pública, quando se aproximou um indivíduo a pé, que estaria acompanhado de outros, mais dois ou três, e fez os disparos — detalha a delegada Roberta Bertoldo, da 2ª Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP).
Em Vitor foram localizadas 14 perfurações, e em João, 13. Uma das hipóteses é que, na tentativa de se defender, Vitor tenha usado o outro como espécie de escudo, colocando-o na frente dos tiros, já que os dois tombaram praticamente juntos.
— Esses indivíduos possuem certa relação com o tráfico. Têm antecedentes por isso — afirma a delegada.
Nessa área da Vila Farrapos, o tráfico é dominado por um criminoso que está preso, desde 2017. Segundo a polícia, ele possui diversos mandados de prisão preventiva por homicídios naquela mesma região.
— Quando foi preso, era um dos responsáveis pela maior parte dos homicídios ali. Depois, os índices baixaram significativamente. O que se observa agora é que há disputa dessa área. São grupos criminosos locais, disputando o território — explica a delegada.
Em razão dessa disputa, os traficantes estariam sempre atentos ao ingresso de pessoas de fora da região no local. Esse pode ter sido o motivo da morte de um jovem, sem antecedentes, na madrugada de segunda-feira (19). Henrique Mariano Bangestan da Costa, 20 anos, que era morador de Viamão, foi morto também com dezenas disparos de arma de fogo na mesma comunidade, a cerca de 500 metros do local do crime de sexta-feira.
Os atiradores teriam disparado rajadas de dentro de um carro. No local, foram encontrados estojos de pistola calibre 9 milímetros e também de fuzil 556.
— Não sabemos ainda o motivo de ele estar ali, se tinha algum vínculo com grupo criminoso, se estava visitando alguém. É uma situação que precisa evoluir — diz Roberta.
Segundo a BM, o policiamento foi reforçado no local pelo 11º Batalhão de Polícia Militar (BPM). Na segunda-feira de madrugada, um homem fugiu dos policiais deixando para trás uma mochila com munição e dois radiocomunicadores. Na tarde de terça-feira, os PMs encontraram em uma casa na Rua Frederico Mentz quatro armas e radiocomunicadores. À noite, segundo o comandante do 11º BPM, tenente-coronel André Ilha Feliú, a equipe foi recebida a tiros ao tentar abordar um Versa.
Motorista de app
Neste confronto, foram mortos o carona e o condutor do veículo. Um policial militar também ficou ferido de raspão região da cintura, e foi encaminhado ao Hospital Cristo Redentor. Um dos mortos era Pablo Messias Schmitt, 33 anos, motorista de aplicativo, sem histórico de envolvimento com tráfico de drogas. Ele tinha uma passagem por violência doméstica, segundo a polícia.
A versão apresentada pelos policiais militares é de que os dois estavam armados. Haveria ainda um terceiro, que teria escapado correndo, com uma arma longa na mão. Uma das hipóteses investigadas pela Polícia Civil é que Pablo estivesse no local somente para fazer a corrida. A polícia vai acionar a plataforma para a qual o condutor trabalhava para saber quais os trajetos de corridas realizados por ele na noite desta terça-feira.
— Teoricamente, agora nesse momento, ele era alguém que estava fazendo uma corrida. É claro que existem depoimentos dos policias afirmando que ambos estavam com arma e atirando contra a polícia. A alegação dos policias é de que o motorista fez disparos. Foi ferido um policial e eles revidaram. Isso tudo vai ser apurado, com exames periciais, inclusive. Vamos coletar depoimentos de pessoas. Ontem mesmo sete policiais prestaram depoimento — explica a delegada.
A perícia deverá ajudar a esclarecer o caso e apontar, por exemplo, o número de disparos efetuados. Dentro do carro foram encontradas quatro armas (três pistolas e um revólver), além de munição, radiocomunicadores e drogas. O outro morto foi identificado como Bruno Ezequiel Prado Chaves, 21 anos, com antecedentes por tráfico, homicídio, roubo e porte ilegal de arma de fogo. Ele era morador da Vila Farrapos. A BM informou que instaurou um inquérito policial militar para apurar o fato.
Os casos
Sexta-feira – 23h30min
- Vitor de Lima Oliveira, 19 anos, e João Manuel Goulart, 24 anos, foram mortos a tiros na Rua Seiscentos e Noventa e Oito. Ambos tinham antecedentes por tráfico de drogas e outros crimes.
Segunda-feira – 5 horas
- Henrique Mariano Bangestan da Costa, 20 anos, foi executado com tiros de pistola e fuzil no Acesso B5. Não tinha antecedentes e era morador de Viamão.
Terça-feira – 19h30min
- Pablo Messias Schmitt, 33 anos, e Bruno Ezequiel Prado Chaves, 21 anos, morreram durante confronto com a BM na Rua Ciro Vaz Álvares. Pablo tinha um antecedente por violência doméstica, e Bruno, por tráfico, homicídio e outros crimes.