Uma das quatro cidades mais antigas do Rio Grande do Sul, Rio Pardo nos últimos meses depara com uma realidade que assusta moradores. Neste ano, 21 pessoas já foram assassinadas no município do Vale do Rio Pardo, enquanto em todo 2019 foram seis pessoas mortas. Por trás de parte destes crimes, está um grupo criminoso que é alvo de operação da Polícia Civil na manhã desta quinta-feira (10). Na ação, estão envolvidos pelo menos 200 agentes, que cumprem 59 mandados – 16 de prisão preventiva, três de apreensão de adolescentes e 40 de busca e apreensão.
Até o momento, 19 pessoas foram presas e um adolescente foi apreendido — destes, 11 foram detidos em Rio Pardo. A polícia ainda tenta prender mais duas pessoas e apreender dois adolescentes. Das prisões realizadas, cinco foram em flagrante, por tráfico de drogas.
Além de Rio Pardo, também são cumpridos mandados na cidade vizinha, Santa Cruz do Sul (quatro deles de prisão), e ainda em Canoas, na Região Metropolitana, (apreensão de um adolescente), em Ijuí, no Noroeste, e em Charqueadas, na Região Carbonífera – os dois últimos em unidades prisionais contra duas pessoas já presas. A ofensiva conta com o apoio da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) e da Brigada Militar. Chefiado por um detento atualmente preso em Ijuí, o grupo está vinculado a uma facção do Vale do Sinos, com atuação em diferentes pontos do Estado.
— O alvo é uma organização criminosa voltada ao tráfico de drogas, mas que age com extrema violência, realizando uma série homicídios. Destas mortes, pelo menos 10 podem ser atribuídas a este grupo, metade dos homicídios que aconteceram neste ano — afirma o delegado Anderson Faturi, titular da Delegacia de Rio Pardo.
Entre os presos, estão desde lideranças do grupo, até pessoas com atuação direta nos homicídios e no tráfico de drogas – como transporte de integrantes da facção e recolhimento de dinheiro, por exemplo. A atuação do grupo na cidade não é recente. Há homicídios atribuídos à mesma facção no ano passado e em 2018, por exemplo. No entanto, as ações têm se tornado mais frequentes e brutais.
— Ainda não identificamos o motivo exato desse aumento. Mas a violência empregada aumentou, além dos casos. A grande maioria das pessoas assassinadas ou possuía dívida com o grupo ou chegou a ser colaborador, mas por algum motivo foi rejeitado. Alguns cometeram pequenos furtos de drogas ou de dinheiro. O que eles parecem querer passar é esse recado de que se não andar conforme eles exigem, vai ser morto — detalha o delegado.
As investigações tiveram início em março deste ano e já foram realizadas seis prisões, em ações conjuntas com a Brigada Militar, além de apreensões de drogas e veículos. A apuração aponta que o líder da organização investigada está recolhido junto ao sistema prisional, atualmente em Ijuí, comandando os crimes de tráfico e homicídios do interior da cadeia. Até agora, segundo a polícia, 56 pessoas foram identificadas como integrantes do grupo.
Em um dos pontos onde foram realizadas buscas, havia suspeita de que pudessem haver corpos de vítimas de homicídio enterrados, no pátio de uma residência. Por isso, foi usada uma retroescavadeira no local, mas nada foi encontrado.
Casa do terror
Um dos pontos alvos da operação nesta quinta-feira é uma casa na Vila Pinheiros, usada como ponto de tortura e execução de vítimas. Neste local, os policiais identificaram três mortes com requintes de crueldade. Uma delas é a execução de um motorista de aplicativo, no fim do mês de agosto, que residia em Cruz Alta. Segundo a investigação da polícia, ele foi atraído para uma emboscada em Rio Pardo após ter se envolvido com uma mulher que manteve relacionamento com um criminoso. A morte teria sido encomendada por este traficante, que queria se vingar da vítima.
Patrick Brum Dall Ongaro, 30 anos, foi assassinado de forma brutal - o crime teria acontecido nesta casa que é alvo da ofensiva. Um vídeo obtido pela investigação mostra o momento em que a vítima, ainda com vida, teve o pescoço cortado. A polícia identificou a participação de duas mulheres e cinco homens no crime – entre eles, o mandante que está preso. Todos são alvo da operação desencadeada hoje.
Além do motorista, na mesma casa foi morto outro homem, que também teve o pescoço cortado, e um outro foi assassinado com pauladas na cabeça. Todas as vítimas dos homicídios cometidos pelo grupo foram homens, a maior parte usuários de drogas, ou envolvidos com o tráfico de drogas de alguma forma, segundo a polícia.
— Os três foram mortos nessa mesma casa, com extrema violência, crueldade. Nos demais crimes, as vítimas foram mortas a tiros — afirma Faturi.
Aumento da violência
Os dados da Secretaria da Segurança Pública (SSP) do Estado e da Polícia Civil indicam que desde 2002, quando os indicadores são contabilizados por município, não há registro de um número tão alto de assassinatos na cidade. Os dados da SSP indicam 15 homicídios registrados em Rio Pardo até o fim de novembro, mas, segundo a polícia, no total aconteceram 21 assassinatos, já que alguns foram registrados como desaparecimentos ou encontros de cadáveres.
Um jovem morador de uma das comunidades com atuação do tráfico de drogas na cidade diz que essa elevação da violência gera insegurança e sensação de impunidade.
— Gera medo, sensação de que a Justiça não serve para nada. Para denunciar qualquer coisa é preciso se expor. Acaba que ninguém quer se envolver — descreve.