Você imaginaria que quando os pais ficassem sabendo de uma vacina que poderia impedir cânceres futuros em seus filhos, eles não deixariam passar a oportunidade. Infelizmente, esse não é caso de uma vacina que previne infecções pelo HPV, o papilomavírus humano, causador de câncer. A vacina, melhor aplicada nas idades de 11 a 12 anos, é a imunização disponível para crianças mais subutilizada.O HPV é de longe a infecção sexual transmissível mais comum nos Estados Unidos, e quase toda pessoa com vida sexual ativa é infectada em algum estágio da vida. Em uma de suas muitas variantes, o vírus provoca mais de 90 por cento dos casos de câncer do colo do útero, além da maioria dos cânceres de vulva, vagina, ânus, pênis e orofaringe, que inclui a parte posterior da garganta, base da língua e das amídalas. Ele também causa verrugas genitais.Todos os anos, segundo dados dos Centros para Controle e Prevenção de Doenças dos EUA, aproximadamente 14 milhões de norte-americanos se infectam com o HPV, na maioria adolescentes ou jovens adultos, e um câncer causado por HPV é diagnosticado em estimados 17.600 mulheres e 9.300 homens.Mesmo assim, quando um dos meus filhos foi encorajado a dar a vacina contra HPV a seus filhos, de 11 e 14 anos, ele respondeu: "Por quê? Eles não têm vida sexual ativa". Eu lembrei a ele que nem todo sexo é consensual, e a exposição ao vírus não requer penetração. Contudo, sua resposta reflete um equívoco comum entre milhões de pais, e muitas vezes dos médicos dos filhos, quanto à importância da vacina e ao fato de que ela é mais eficiente se aplicada em pré-adolescentes quando o sistema imune é mais forte e antes de serem expostos a uma forma agressiva do vírus.Mas até 2014, somente 40 por cento das meninas e 21 por cento dos meninos com idades entre 13 e 17 anos haviam recebido as três doses da vacina contra HPV, enquanto 88 por cento de garotos e garotas receberam a vacina tríplice (tétano, difteria e coqueluche) e 79 por cento receberam a vacina contra meningite.Existem várias explicações para a taxa baixa de imunização contra o HPV entre adolescentes jovens. Uma é a de que a vacina é relativamente nova – foi aprovada em 2006 – e cara. Custando cerca de US$ 300 a dose, uma série de três doses pode beirar os US$ 1 mil por criança, embora agora, como se dá com outras vacinas recomendadas pelo governo norte-americano, seja coberta pelos planos de saúde sem necessidade de desembolso por parte da família, e o programa federal Vacinas para Crianças oferece vacinação gratuita para as crianças sem seguro-saúde, segundo a Sociedade Americana de Câncer.Em julho, a Sociedade atualizou sua diretriz de imunização para a vacina contra o HPV, alinhando-a à orientação divulgada dois anos atrás pelo Comitê Consultivo sobre Práticas de Imunização, órgão federal dos Estados Unidos. Embora o Comitê tenha considerado provas oriundas principalmente de estudos patrocinados por empresas, foram examinados estudos adicionais realizados por pesquisadores independentes.A Sociedade Americana de Câncer também definiu mais cuidadosamente o efeito da idade à época da imunização, encontrando eficácia reduzida nos mais velhos, o que ressalta a importância da vacinação precoce."Se a vacina for dada a pessoas de 22 a 26 anos, os médicos deveriam informar aos pacientes que ela é menos eficaz", diz Debbie Saslow, diretora de intervenção para o controle do câncer da Sociedade Americana de Câncer. Mesmo assim, ainda não é tarde para imunizar universitários que não foram vacinados quando mais jovens, ela afirma.Um segundo obstáculo para uma imunização mais ampla do HPV é a crença equivocada segundo a qual ela promoveria a promiscuidade adolescente, argumento mais comumente utilizado para deter a orientação sobre o controle da natalidade entre adolescentes. Não existe conexão direta entre a vacina e a atividade sexual, nem motivo para sugerir uma, garante Debbie, principal autora das diretrizes atualizadas da Sociedade Americana de Câncer. Se perguntado, o pai ou médico deve simplesmente afirmar que a vacina previne a infecção de um vírus muito comum que pode causar câncer.Embora uma parte da publicidade inicial da vacina se concentrasse na prevenção de doenças sexualmente transmissíveis, conta Debbie, "em primeiríssimo lugar, esta é uma vacina para prevenir câncer. Diversos estudos demonstraram não haver impacto negativo em qualquer mensuração de atividade sexual entre garotas que receberam a vacina contra o HPV. Você não diz a adolescentes aprendendo a dirigir para não usar o cinto segurança porque isso pode incentivá-los a passar por sinais vermelhos".O apoio dos pais para vacinar crianças de 11 e 12 anos contra o HPV tem sido fraco, com somente um a cada cinco acreditando que ela deveria ser exigida para a entrada na faculdade. Vários estados propuseram vacinação obrigatória, e um levantamento em escala nacional com 1501 pais de crianças de 11 a 17 anos demonstrou que incluir uma cláusula de "não opção" quase triplicaria o apoio paterno para essa exigência, segundo pesquisadores da Faculdade Gillings de Saúde Pública Global da Universidade da Carolina do Norte.O argumento mais pernicioso contra a imunização ao HPV envolve publicações na internet de histórias de terror não comprovados que alguns pais atribuem à vacina, semelhante ao equívoco de atribuir o autismo à vacina contra sarampo, caxumba e rubéola. Nenhum dos relatos de efeitos colaterais negativos ligados à vacina contra o HPV saiu de pesquisas confiáveis.Os efeitos colaterais mais comuns são a dor local, vermelhidão ou inchaço no local da injeção intramuscular. Da mesma forma que outras vacinas dadas a adolescentes, às vezes ocorrem desmaios, e os pacientes devem ser aconselhados a ficar sentados ou deitados por 15 minutos após a vacinação.A vacina em três doses deve ser dada a meninos e meninas da seguinte forma: a primeira dose deveria ser idealmente aplicada aos 11 ou 12 anos, mas também pode ser dada a crianças com nove anos ou adultos de até 26. A segunda dose é administrada um ou dois meses depois da primeira, e a terceira é aplicada seis meses após a primeira. A proteção só é completa após a aplicação das três doses. Contudo, não existe intervalo máximo; se qualquer dose atrasar, ela pode ser aplicada assim que possível. Não existe necessidade de reiniciar a série.A vacina pode ser administrada com segurança ao mesmo tempo em que outras vacinas são aplicadas, como a tríplice, por exemplo. Embora a vacina contra o HPV não deva ser aplicada durante a gravidez, não se descobriu problemas no feto quando a gravidez foi descoberta depois que uma ou mais doses da vacina haviam sido aplicadas.Até agora, também não existe indicação de que a proteção diminua com o tempo. Indivíduos acompanhados por até dez anos após a imunização não demonstraram sinal de proteção reduzida, e doses de reforço não são necessárias.
Por Jane E. Brody do NYT.