O quanto a proibição pode ser a desencadeadora de determinados comportamentos inadequados. Já paraste pra pensar nisso? Pois eu tenho pensado bastante.
Dia desses, uma mãe veio me comentar que sua filha, que nunca come "porcaria", teve uma espécie de intoxicação alimentar após um aniversário, por ter se empanturrado de doces. Uma velha amiga me contou, anos atrás, toda preocupada, que seu filho adolescente, que nunca dava problema (aliás, já me falou isso com certa desconfiança, como se houvesse algo errado em um adolescente que não dá trabalho), tinha ido a uma festa cujo "after" havia sido no hospital, tomando glicose. Ela me dizia algo como "logo na nossa família, onde álcool é assunto proibido e não entra nem nas festas de final de ano!".
Talvez esse seja o problema de muitas famílias mundo afora: a proibição veemente. Calma! Não estou fazendo apologia ao excesso de gordura, corantes, conservantes e álcool. Mas estou defendendo, sim, o direito legítimo à educação. E educação não necessita ser formalizada. Aliás, o ato de educar deveria fazer parte da rotina, do dia a dia, porque é nesses momentos que questões importantes vêm à tona e merecem ser discutidas.
Assim como as janelas de oportunidade - períodos em que as crianças estão mais aptas a aprender determinado assunto - auxiliam no aprendizado de línguas estrangeiras, por exemplo, podem também ajudar na compreensão de conceitos importantes e principalmente na formação de hábitos.
Então é disso que os pais devem se aproveitar, sem nenhum peso na consciência. O veto inflexível, na maioria das vezes, não garante a falta de contato das crianças e dos adolescentes com o objeto de repúdio dos pais. Montaigne já dizia, em pleno século 15, que proibir era despertar o desejo. E, embora eu discorde da soberania da frase, acredito que ele não estava de todo errado, não. Algumas vezes, quando alguém nos diz um "não" sem explicação alguma, aguça um pouco da curiosidade.
O que nós adultos precisamos entender e pôr em prática é o "não" respaldado, a proibição esclarecida e apoiada em argumentos sólidos e bem ilustrados - criança precisa do "concreto". E mais! Precisamos da flexibilidade de, dependendo o caso, evitarmos, em vez de proibirmos.
Tu pode estar te perguntando agora: "Mas ela não defende tanto a necessidade de dizer não às crianças e dos pais assumirem seu lugar de autoridade dentro dessa relação familiar?". Sim, eu defendo isso, mas com o adendo de tudo estar permeado pelo uso de equilíbrio e de bom senso. Uma criança que tem seus limites bem definidos pela família, por meio de conversas francas e esclarecedoras, tem muito mais chances de se tornar um adulto mais tranquilo, compreensivo, flexível e altruísta. A própria empatia é construída assim, com diálogo e reflexão. Sem contar que um acordo, em que a criança sinta que participou da decisão - nem que seja apenas por meio da compreensão do motivo pelo qual algo lhe é proibido -, é muito mais fácil de ser acatado do que uma simples inibição autoritária e ditatorial.
Dá trabalho, mas auxilia na construção de um ser humano melhor. E o objetivo é sempre esse.
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