O avanço no tratamento do câncer de mama tem permitido a indicação de cirurgias cada vez menos invasivas, que envolvem apenas a retirada de uma pequena porção do seio. Mesmo assim, a taxa de adoção desse tipo de procedimento tem ficado abaixo do esperado. Sob o ponto de vista da importância da manutenção das mamas para a autoestima da mulher, esse tema foi destaque no Congresso da Sociedade Europeia de Oncologia Clínica, em Viena, na Áustria.
A indicação da cirurgia capaz de conservar grande parte da mama é possível quando o tumor é pequeno ou, nos casos de tumores grandes, a paciente apresenta uma boa resposta ao tratamento neoadjuvante (quimioterapia aplicada antes da cirurgia com o objetivo de diminuir o tamanho do nódulo).
O que a pesquisadora Carmen Criscitiello, do Instituto Europeu de Oncologia, descobriu é que o número de indicações de cirurgias que preservam as mamas não tem aumentado na mesma proporção em que melhoram as respostas das pacientes às novas terapias neoadjuvantes.
Para chegar a essa conclusão, ela tomou por base um estudo anterior que avaliou a eficácia de três estratégias de quimioterapia neoadjuvante para 429 pacientes com tumor do tipo HER2 positivo. Um grupo recebeu a droga lapatinibe, o outro recebeu o trastuzumabe e um terceiro, a combinação das duas terapias. Deste último grupo, 51,5% das pacientes tiveram uma resposta completa à terapia, enquanto nos outros grupos, essa taxa foi de 24,7% e de 29,5% respectivamente.
O esperado seria que o terceiro grupo, por ter respondido melhor, recebesse mais indicações de cirurgias que preservam as mamas. Porém, o que ocorreu foi que nos três grupos, independentemente da resposta ao tratamento, apenas 40% das pacientes puderam conservar o seio.
- O estudo destaca uma atitude negativa que pode privar grande fração de mulheres da chance de preservar sua mama, sem nenhuma razão clínica para justificar essa decisão - diz Carmen.
Ela acrescenta que as características do tumor anteriores à quimioterapia inicial tiveram papel importante na decisão do tipo de cirurgia.
- Um dos objetivos da terapia neoadjuvante é obter um aumento da taxa de conservação de mama, mas esse objetivo é claramente frustrado se o tipo de cirurgia for escolhida somente de acordo com as características iniciais do tumor - completa Carmen.
No Brasil
Segundo a mastologista Maira Caleffi, presidente da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama), esse processo também pode ser observado no Brasil. Para ela, apesar de melhores condições para se realizar a cirurgia que preserva a mama, o que se observa na prática é que muitas pacientes são informadas pelos próprios cirurgiões que talvez seja melhor tirar tudo e retirar ainda a outra mama como profilaxia.
Maira ressalta que esse procedimento não tem respaldo científico, a não ser que a mulher possua uma mutação genética familiar que predisponha ao câncer.
- Isso é um desserviço que vem sido praticado. ê um exagero, que não observa as recomendações das autoridades e das sociedades médicas - afirma.
A decisão sobre qual será o procedimento adotado deve ser compartilhada entre médico e paciente, de acordo com o mastologista Wesley Pereira Andrade, do Hospital A.C.Camargo. Em casos de tumores grandes, pode-se tanto começar o tratamento com a cirurgia mais radical e depois introduzir a quimioterapia quanto adotar a neoadjuvante para tentar conservar a mama.
- Quando se preserva a mama, existe um ganho psicológico. A desvantagem é uma maior chance de o tumor voltar ao longo de dez anos - diz.
Ele observa que a mulher que preserva a mama tem uma aceitação melhor de sua autoimagem.
Para o ginecologista e cirurgião oncológico Fábio Laginha, do Hospital 9 de Julho, depois dos avanços nas novas drogas contra câncer de mama, é preciso progredir nos métodos de imagem e nas técnicas cirúrgicas que permitam a retirada da porção exata da mama necessária para eliminar todas as células cancerígenas.
- O que precisa ser feito, quando se escolhe esse tipo de quimioterapia neoadjuvante, é ter certeza do local do tumor, marcar e acompanhar sua diminuição - diz.