A animação era tanta que algumas crianças nem conseguiram dormir na noite de quinta (14) para sexta-feira (15), ansiosas pelo Trote Solidário Careca Amiga, realizado no Hospital da Criança Santo Antônio da Santa Casa de Misericórdia na manhã desta sexta-feira (15). Os pequenos pacientes oncológicos puderam compartilhar certa semelhança visual com os estudantes da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) ao cortar os cabelos dos universitários para doação. Agora, as mechas doadas pelos alunos serão transformadas em perucas para crianças com câncer pela ONG Cabelaço.
O clima de festa e diversão contagiou os pequenos, os pais, os estudantes e os funcionários do hospital que participaram da ação. As crianças seguravam as tesouras e as máquinas com concentração, para garantir um bom trabalho e acertar na mudança de visual dos universitários – além delas, três profissionais trouxeram os equipamentos e auxiliaram nos cortes. Já os pais fizeram questão de registrar todos os momentos em fotos e vídeos.
Ajudante em mais de um corte, Manuela Hanauer, 11 anos, já estava pegando a prática. A pequena se identificou com os estudantes que participaram da ação.
— Achei bem legal eles quererem cortar o cabelo para ajudar, fazer doações. Ficou bonito, mais bonito do que grande — afirmou Manuela, que quer ser professora quando crescer.
A filha estava animada para comparecer, conforme a mãe, Luciane Hanauer, 33 anos, assessora legislativa — e vê-la em ação foi uma experiência bacana.
— É uma manhã bem divertida para nós aqui. O evento é muito importante para conscientizar as pessoas sobre o câncer. É uma iniciativa muito importante tanto para as crianças quanto para os adultos — ressaltou.
Impacto na cura
O Trote Solidário Careca Amiga teve início em 2015, mas ficou dois anos sem ser realizado devido à pandemia, sendo retomado no ano passado. A iniciativa foi dos próprios alunos da UFCSPA, como parte do trote solidário.
— Nos procuraram com a proposta de raspar o cabelo, que já é algo tradicional de trotes, porém raspar aqui, pelas mãos das crianças que têm as cabeças raspadas, para dar força, mostrar que qualquer um pode também raspar e tudo bem essa questão de visual. E também que isso se tornasse um momento lúdico, que elas se divertissem fazendo isso. E é o que acontece, as crianças adoram. Quem está aqui está muito contente, dá para ver no rostinho deles — afirmou Daliana Pereira, profissional de Educação Física da Recreação do hospital, que ajuda a organizar o evento.
Hoje, além dos calouros, alunos de outros semestres e outras faculdades participam do "trote". Nesta edição, pacientes que consultam no hospital, bem como internados, estiveram no evento. Este tipo de ação é importante pois o processo de hospitalização é de extremo estresse, explicou Roberta Alves da Silva, oncologista pediatra da Santa Casa e uma das responsáveis pela iniciativa:
— Trazer o lúdico de novo para a vida dessas crianças é muito importante para o impacto na cura. A gente prescreve não apenas a quimioterapia, precisa prescrever o lúdico, a brincadeira, elas precisam voltar a sorrir. Criança que sorri e brinca volta a sonhar, e muda o mundo dela.
A médica lembrou que esse momento é importante não só para os pequenos, como para os familiares. Além disso, ressaltou que é bom trazer a sociedade para dentro do hospital para fazer essas crianças serem notadas — elas precisam ser reinseridas, pois, em breve, estarão "bem e curadas", já que o câncer infantil tem alto índice de cura, segundo a oncologista.
— O corte de cabelo é um ritual de passagem: os alunos que vão passar para vida acadêmica e eles, que estão no processo de adoecimento. Então é importante tirar as coisas boas desse momento. É passageiro. A gente quer que as coisas boas voltem na vida de todo mundo. É isso que essa campanha acaba favorecendo — acrescentou.
Na ação, as mulheres diminuíram o comprimento dos cortes, e os homens rasparam a cabeça. Estudante do sétimo semestre de Biomedicina da UFCSPA, Alexia dos Santos, 24 anos, foi uma das alunas que doou mechas.
— Muito emocionante participar desse momento. Eu já tive câncer, em 2014, então eu entendo a importância e o quanto isso (cortar o cabelo) afeta a nossa autoestima, principalmente de crianças, que não entendem, ainda, muito bem — disse, emocionada.
Uma das responsáveis por cortar o cabelo de Alexia foi Marina Enck Rosa, sete anos. Eufórica, ela não conseguiu dormir à noite na expectativa de participar do evento. A mãe, Michele Enck, 40, fisioterapeuta, achou a iniciativa "maravilhosa".
— Muito lindo tudo, o projeto é muito legal, achei fantástico. Tem a importância dessa coisa da careca, da gente mostrar o quanto isso pode ser bonito igual, pode estar linda igual — apontou.
— Eu gostei mais de cortar o cabelo. Achei legal (os cabelos curtos), bonitos — destacou Marina.
Aluna do quinto semestre de Biomedicina, Maria Carolina Xavier, 23 anos, também fez questão de participar. Ela se inscreveu assim que a ação foi divulgada.
— Eu já queria cortar o cabelo e achei muito legal essa ação. Eu achei bem emocionante, é uma realidade que eu não conhecia.
Quanto ao resultado, ainda não tinha se visto no espelho.
— Mas acho que ficou bom, tive boas cabeleireiras, então eu acredito — ressaltou.