Uma pesquisa feita por cientistas da Universidade Feevale, em Novo Hamburgo, em parceria com o Laboratório Nacional de Ciência da Computação (LNCC), descobriu uma nova variante do coronavírus em pacientes no Rio Grande do Sul. Análises preliminares realizadas a partir de amostras coletadas no Estado no início de dezembro indicam a presença, na proteína S, da variante E484K – mesma mutação do coronavírus identificada no Rio de Janeiro no final de 2020.
O estudo também descreve uma possível nova linhagem do vírus Sars-Cov-2 em circulação no Estado e avalia sua dispersão para outras regiões do Brasil. No caso da linhagem gaúcha, assim como ocorre no Rio de Janeiro, os pesquisadores investigam se pode haver perda na ligação de anticorpos específicos, dificultando o combate ao coronavírus.
— Existe uma mutação similar a essa que está preocupando também na África do Sul. Essa mesma mutação ocorre na linhagem do Rio de Janeiro. E essa mutação tem sido associada à possibilidade da geração de mutantes de escape: esses vírus escapam dos anticorpos formados contra outras linhagens. É o que está parecendo que pode ocorrer e o que está sendo monitorado — explica o professor Fernando Spilki, coordenador do Laboratório de Microbiologia Molecular da Feevale.
Os pesquisadores estão finalizando a análise do genoma completo de 92 amostras virais de circulação recente no Rio Grande do Sul. Com o objetivo de colaborar com a comunidade científica no enfrentamento à covid-19, os genomas sequenciados foram depositados em bases de dados internacionais e em breve a caracterização dessas amostras deve ser descrita em publicação científica de amplo acesso.
Os resultados da pesquisa no Rio Grande do Sul ainda não afirmam se essa nova linhagem da covid-19 é mais infecciosa ou mais agressiva. Também não há indícios de que ela seja resistente às vacinas que estão sendo aplicadas ou em desenvolvimento, mas Spilki relata que isso está sendo monitorado.
— A gente sempre tem que fazer estudos, e é o que estamos fazendo. Vendo se soros de pessoas que participaram de testes conseguem neutralizar esses vírus, se em pessoas que se recuperaram da covid-19 os anticorpos conseguem neutralizar esse vírus. Já existe, fora do Brasil, notícia de que essas variantes com a mutação E484K têm problemas com essa neutralização — detalha o professor.
Já existe, fora do Brasil, notícia de que essas variantes com a mutação E484K têm problemas com essa neutralização (do vírus)
FERNANDO SPILKI
Coordenador do Laboratório de Microbiologia Molecular da Feevale
Spilki, que coordena também a Rede Corona-ômica-BR, iniciativa da Rede Vírus, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), da qual fazem parte os dois laboratórios envolvidos na pesquisa, relata que há casos, em outros países, de indivíduos imunizados ou infectados por outras variantes que não conseguem neutralizar essa mutação adequadamente. Experimentos para determinar se isso também acontece com a linhagem gaúcha estão sendo realizados e devem ser divulgados nas próximas semanas.
Ainda não é possível saber se as medidas de distanciamento social deverão ser mais rígidas por conta dessa nova cepa. Porém, os cientistas alertam que é mais um indício de que o vírus está em circulação e em constante processo de mutação.
Apelo pela ciência e pesquisa
Os pesquisadores fazem, ainda, um apelo pelo trabalho coletivo em favor da ciência e da pesquisa no Brasil. A coordenadora do Laboratório de Bioinformática do LNCC, Ana Tereza Vasconcelos, ressalta que os cientistas estão adiantando essas informações da análise do genoma para alertar às autoridades sanitárias, já que os estudos e também eventuais dispersões da covid-19 são extremamente importantes para a segurança de todos.
— A crescente diversidade genética do Sars-Cov-2 encontrada neste estudo e em trabalhos recentes no Brasil reitera a importância da constituição de redes de sequenciamento e análises genéticas colaborativas para a realização de vigilância genômica — alerta Ana Tereza, lembrando da necessidade de investimento em pesquisa e formação de recursos humanos, de forma contínua, para o enfrentamento dessa pandemia e de futuros desafios de saúde pública no país.
O Rio Grande do Sul registrou nesta sexta-feira (8) mais 66 mortes pelo coronavírus. Agora, o total de vítimas da doença no Estado é de 9.359 desde o início da pandemia, em março de 2020. A Secretaria Estadual da Saúde (SES) confirmou ainda 4.964 novos infectados nas últimas 24 horas, chegando a um total de 474.917 casos notificados. No Brasil, a marca de vítimas da doença passou de 200 mil na quinta-feira (7).