Foi só esquentar para sermos alertados de algo novo com que devemos nos preocupar na hora de alcançarmos aquele tubo de protetor solar: os ingredientes contidos nele.
Em fevereiro, a Food and Drug Administration (FDA – agência federal norte-americana responsável pelo controle de alimentos e remédios) anunciou possíveis mudanças nas diretrizes que regulamentam o protetor solar – ou seja, as regras definidas pela agência e que devem ser seguidas por produtos com fator de proteção solar (FPS), considerados medicamentos de venda livre.
Como parte das revisões propostas, que já devem entrar em vigor em novembro, a FDA está exigindo pesquisas adicionais sobre 12 ingredientes, incluindo metoxicinamato de octila, octissalato e oxibenzona. Muito provavelmente, pelo menos um deles está presente no protetor solar que você carrega na bolsa de maquiagem ou na mala de praia.
A FDA não está dizendo que esses compostos químicos não são seguros. "Simplesmente não temos informações suficientes para dar um aval. Quando falamos de segurança, precisamos lembrar que nada é totalmente seguro", afirmou a médica Theresa Michele, diretora do Departamento de Produtos Medicamentosos sem Prescrição da FDA. Ela disse ainda que a agência avalia a relação entre risco e benefício para cada remédio que examina, "e é isso que estamos definindo aqui".
Foi demonstrado em alguns estudos que a oxibenzona, por exemplo, é capaz de desestabilizar hormônios; além disso, a absorção pelo corpo é mais intensa do que se acreditava.
"Os componentes químicos podem entrar em nosso organismo mais prontamente e em maior quantidade. Eles, assim como nós, estão preocupados com essa absorção sistemática", afirmou Nneka Leiba, diretora de ciência salutar e orgânica do Environmental Working Group, uma organização de pesquisa e defesa de direitos baseada em Washington.
Além disso, algumas outras substâncias químicas foram relacionadas a alterações endócrinas. No entanto, acima de tudo, e é esse o ponto enfatizado pela FDA, simplesmente não existem estudos suficientes sobre elas. A oxibenzona apresenta uma alta taxa de reação alérgica e irritação, e alguns pesquisadores acreditam que possa haver uma conexão entre a alteração hormonal causada e casos de câncer.
Também foi comprovado que tanto a oxibenzona quanto o metoxicinamato de octila causam danos à camada de coral do oceano. O termo ainda sem regulamentação "não prejudicial aos corais" transformou-se em uma maneira de as marcas e os revendedores designarem produtos que não contêm tais ingredientes. No ano passado, o Havaí aprovou uma lei para banir a venda de protetores solares que os trazem na fórmula; Key West, na Flórida, recentemente seguiu o exemplo. A lei passa a valer a partir de 1º de janeiro de 2021.
Portanto, quais ingredientes são considerados seguros?
A FDA propõe que dois ingredientes, o óxido de zinco e o dióxido de titânio, em determinadas proporções, sejam considerados GRASE, acrônimo em inglês que significa "geralmente reconhecido como seguro e eficaz". Eles são bloqueadores minerais que ficam na pele para bloquear fisicamente os raios de sol em vez de proteger a pele por meio de uma reação química à luz.
Alguns novos produtos têm como base esses ingredientes, como o protetor facial com FPS 30 da REN, Clean Skincare Clean Screen Mineral (36 dólares, ou 143 reais), com óxido de zinco na fórmula, e o hidratante com FPS 30 da Naturally Serious, Mineral Sun Defense Moisturizer Broad Spectrum, recentemente lançado.
Entre outros protetores solares minerais disponíveis no mercado, estão o protetor diário com FPS 30 da Drunk Elephant, Umbra Sheer Physical Daily Defense (34 dólares, ou 135 reais), cujas vendas, segundo a empresa, triplicaram no ano passado, e as opções da especialista em sol Neutrogena.
Algumas marcas estão reformulando produtos para que passem a ter base mineral.
Algumas marcas estão reformulando produtos para que passem a ter base mineral. A Chantecaille, por exemplo, vai lançar no próximo ano uma nova versão do primer facial com protetor solar FPS 45, Ultra Sun Protection Sunscreen Broad Spectrum, que será desenvolvida com ingredientes minerais.
A Supergoop usou óxido de zinco como base de um novo produto, um talco em spray, Poof 100% Mineral Part Powder, cujo propósito é proteger uma região negligenciada pela maioria das pessoas: o couro cabeludo. Recentemente, a empresa introduziu uma linha de sombras cremosas com FPS 30, cuja proteção advém da mistura de óxido de zinco com salicilato de octilo – o último é um dos ingredientes que a FDA está questionando.
A proposta da FDA também aborda em quais formatos seriam permitidos os produtos de proteção solar. Como os talcos, que estão no mercado, mas que apenas agora estão sendo submetidos a revisões como um meio adequado de proteção solar. A agência também vai sugerir o aumento do valor máximo do FPS de 50 para 60+ nos rótulos após novos achados terem demonstrado que o FPS mais elevado é eficaz.
"Nós nos debruçamos sobre esses produtos que não precisam de prescrição para tentar fazer com que os rótulos sejam de fácil entendimento pelo consumidor, o que é muito difícil de conseguir com o protetor solar", esclareceu Michele, da FDA.
Uma vez aprovada a proposta, as empresas que quiserem vender protetores solares sem respeitar as regulamentações precisarão solicitar requerimentos para novos medicamentos.
Somos capazes de abrir mão das substâncias químicas?
Para muitos consumidores, é difícil abandonar protetores de base química, que são efetivos, oferecem uma sensação mais suave e obstruem menos a pele do que muitas das opções com base mineral, que não se misturam da mesma maneira que os protetores químicos e, por isso, podem deixar a pele com uma aparência pálida ou acinzentada.
Os médicos costumam recomendar o meio-termo. A dra. Macrene Alexiades, dermatologista de Manhattan e professora clínica associada na Universidade Yale, sugere que os pacientes usem protetor solar de base mineral no corpo e um de base química com alto FPS no rosto, apesar das preocupações. (Alexiades possui uma linha de cuidados com a pele, a 37 Actives, que inclui um produto com um ingrediente da lista GRASE da FDA.)
"Calculo o risco para sua qualidade de vida se você tiver melasma, ou predisposição para câncer de pele, contra o risco infinitesimalmente pequeno se você aplicar apenas naquela mínima região, que corresponde provavelmente a quatro por cento do corpo. A probabilidade de uma absorção sistêmica significativa é muito, muito baixa", ponderou Alexiades.
Embora a FDA ainda possa mudar a proposta antes da versão final – e tenha chamado o público em geral e fabricantes de protetores solares para comentá-la –, a preocupação demonstrada a respeito dos ingredientes específicos parece ter potencial para causar impacto. "Apenas aquela declaração já vai educar consumidores", disse Leiba, acrescentando acreditar que o mercado vai, em suas palavras, "mudar de forma orgânica".
Por Rachel Felder