O fechamento prolongado do Aeroporto Internacional Salgado Filho, provocado pela enchente de maio em Porto Alegre, afeta diretamente cerca de 4 mil trabalhadores que atuavam no terminal — quantidade de pessoas superior à população de 194 municípios gaúchos. A interrupção no fluxo de passageiros e acompanhantes resulta ainda em uma queda de até 90% no movimento de empreendimentos localizados nas imediações, de barracas de lanche a postos de gasolina. Apesar do registro de demissões pontuais, boa parte dos negócios se esforça para manter o quadro de profissionais até o retorno dos voos à zona norte da Capital.
A concessionária Fraport esclarece que o levantamento sobre postos de trabalho inclui os colaboradores da própria administradora do Salgado Filho, de companhias aéreas, prestadores de serviço, lojas, restaurantes e serviços. Conforme informou a colunista de GZH Giane Guerra, representantes de duas lojas haviam entrado em contato com o Sindicato dos Empregados do Comércio de Porto Alegre (Sindec POA) até a segunda-feira (17) com relato de três demissões de funcionários cada uma. Mas, dentro e fora do terminal, há também um esforço para preservar a força de trabalho.
A assessoria de comunicação da Fraport afirma que a concessionária não fez dispensas até o momento, além de manter negociações com os proprietários de negócios para garantir a manutenção dos empregos. Redes que contam com outras lojas além daquelas no aeroporto recorrem à transferência de pessoal para outras unidades para evitar a formação de uma onda de demissões. Com duas farmácias no local, a Panvel é um dos estabelecimentos que adotaram essa estratégia. Em nota, a empresa afirma que "com o fechamento temporário do complexo, as equipes das filais instaladas no local foram remanejadas provisoriamente para unidades de regiões próximas".
Do lado de fora da estrutura, empresários e trabalhadores autônomos também se desdobram para manter a fonte de renda. Os cerca de 300 taxistas vinculados à Cooperativa de Táxi do Aeroporto (Cootaero), sem os antigos viajantes para transportar, passaram a circular pela Capital e a parar em pontos livres de táxi para encontrar novos passageiros.
— Em razão do limite municipal das licenças, não podemos circular por outras cidades para embarcar passageiros, como em Canoas, que passou a receber voos do Salgado Filho. Então os colegas estão fazendo corridas pelos bairros de Porto Alegre ou realizando viagens programadas que saem da Capital para outros municípios, o que é permitido — revela a vice-presidente da Cootaero, Cleusa Barreto, acrescentando que cerca de um terço dos condutores sofreu danos em suas casas em razão da enchente.
As irmãs e sócias Neusa Moreira, 65 anos, e Silvia Regina Ferraz, 58, foram duplamente impactadas pelo aguaceiro histórico. O trailer recém-adquirido para vender lanches, com apenas duas das 10 prestações pagas, foi atingido pela água. Com uma van substituta, a dupla se mantém trabalhando das 6h30min às 15h na Avenida Severo Dullius junto à cerca externa do Salgado Filho. Agora, seus principais clientes são operários que atuam na limpeza e na recuperação do terminal.
— Tivemos R$ 15 mil de prejuízo com perda de estoque e equipamentos que estragaram, como o nosso freezer. O movimento caiu para menos da metade, mas pelo menos ainda conseguimos atender o pessoal que está trabalhando aqui — conta Neusa.
A queda na demanda foi ainda maior no posto de gasolina e na loja de conveniência localizados nas proximidades da rótula da Severo Dullius.
— O número de clientes caiu 90%, 95%. Paravam aqui diariamente de 1,2 mil a 1,5 mil carros, incluindo muitos veículos de locadoras, e agora chega no máximo a uns cem — revela o supervisor do posto, Bruno Sampaio.
Apesar do sumiço dos motoristas e do fato de as prateleiras apresentarem amplos espaços vazios na loja de conveniência, Sampaio afirma que nenhum dos 21 empregados foi demitido.
— Não tivemos cortes e esperamos manter todo mundo até a reabertura do aeroporto — assegura Sampaio.
Hotéis finalizam preparativos para reabrir
Afetados de forma redobrada pela enchente que ocupou a zona norte de Porto Alegre, hotéis localizados na área do Salgado Filho estão prestes a retomar as atividades. Os estabelecimentos foram atingidos pela lâmina de água que avançou sobre a região e, já secos, agora enfrentam o desafio de voltar a atrair clientes mesmo sem ter uma perspectiva exata de quando o terminal voltará a receber passageiros. O Novotel anuncia que reabrirá as portas na segunda-feira (24), e o Ibis deverá seguir o mesmo caminhos algumas semanas depois.
— Vamos recomeçar com hospedagem e alimentação. Eventos e áreas de lazer ainda vão demorar um pouco mais — afirma o gerente-geral do Novotel, Paulo Monteiro.
O estabelecimento de 166 quartos, que estava praticamente lotado pouco antes da cheia, acumulou 80 centímetros de água no saguão. Os hóspedes remanescentes precisaram ser removidos de barco para outros pontos da cidade. Agora, a expectativa é de que voltem aos poucos mesmo com o aeroporto ainda fechado.
— Cerca de 90% do nosso movimento dependia do Salgado Filho, mas talvez tenhamos outro tipo de demanda na reabertura. A ordem da diretoria é deixar qualquer demissão como uma medida de último caso — complementa Monteiro.
O gerente afirma que o hotel espera contar com o apoio do projeto do governo federal destinado a pagar parte dos salários de funcionários de empresas atingidas pela inundação. A contrapartida para participar do programa é manter os postos de trabalho por pelo menos quatro meses. Dessa forma, 70 vagas seriam preservadas na Capital que ainda tenta superar os efeitos do desastre climático.