Pelo menos dois municípios do Vale dos Sinos arregaçaram as mangas e decidiram assumir as atividades no contraturno escolar que deixaram de ser ofertadas nas escolas pelo Mais Educação, do governo federal. Outras três cidades, também da Região Metropolitana, estão em fase de estudos para voltarem a oferecer projetos no turno inverso.
Em Novo Hamburgo, depois que 50 das 51 instituições municipais foram excluídas do programa federal, a Secretaria de Educação reuniu-se com a Procuradoria Geral do Município e a Secretaria Municipal da Fazenda para discutir a possibilidade de assumir a função. Foi criado o programa Movimentos e Vivências na Educação Integral (Move).
Para beneficiar os mais de 4 mil alunos, o município desembolsará R$ 3 milhões anuais – necessários para a compra e a manutenção de material, o pagamento de monitores e a alimentação dos estudantes. Diariamente, os alunos têm oficinas nas áreas de Língua Portuguesa, Matemática, recreação, cultura, arte e esporte. Na Escola Municipal Presidente Getúlio Vargas, no bairro Rincão, os 320 alunos estão desenvolvendo as potencialidades e habilidades. Estudante do sexto ano, Lucas de Oliveira, 11 anos, descobriu o xadrez numa das oficinas.
— Adoro participar das atividades aqui na escola. Participo do xadrez, robótica e ainda danço. Acho legal participar com meus amigos, já me apresentei em outros bairros e também fora do município — conta.
Punição
Na vizinha Esteio, a prefeitura fez movimento parecido e criou, com recursos próprios, o Programa de Incentivo à Aprendizagem (Pia) para atender às 15 escolas com ensino fundamental. Serão investidos R$ 380 mil neste primeiro ano, segundo o secretário municipal de Educação, Marcos Hermi Dal’Bó. Os valores custearão os monitores e os equipamentos para trabalhos lúdicos.
Mas, devido às condições financeiras, a Secretaria optou por selecionar 50 alunos de cada instituição, a partir de critérios pré-estabelecidos – como vulnerabilidade e dificuldades na aprendizagem. Sapucaia do Sul, Canoas e Viamão estudam a adoção de programas semelhantes.
Para não ficar mais em casa
Em Esteio, os mediadores pedagógicos, contratados por uma empresa terceirizada, conduzem oficinas de raciocínio lógico/matemático, oralidade, escrita e leitura, introdução à metodologia científica e humanidades. Oficineiros selecionados pela prefeitura, conforme indicação das escolas, por sua vez, são responsáveis pelas atividades de esportes e recreação, atletismo, música, dança e teatro.
No Centro Municipal de Educação Básica Flores da Cunha, os estudantes escolhidos aproveitam as quatro horas do turno inverso para participarem das oficinas de capoeira, artes, esportes e reforço escolar. É o caso dos colegas Taíres Estefane de Almeida Azevedo e Paulo Roberto Duarte, ambos de 11 anos.
— Comemorei muito quando fui selecionada para participar do Pia. Adoro a capoeira. Se eu não estivesse na escola, estaria em casa sem fazer nada — comenta Taíres.
— O Mais Educação me ajudou a ter mais concentração e a melhorar as minhas notas em Português. Espero continuar assim no Pia — completa Paulo.
Mãe precisou sair do emprego
No início deste ano, uma decisão do governo federal reduziu em 70% o número de alunos e em 66% a quantidade de escolas públicas gaúchas no programa Novo Mais Educação. A medida, considerada polêmica pela comunidade escolar, levou em conta o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb): as instituições com melhores notas perderam a verba que permitiria a oferta de atividades aos estudantes no turno inverso às aulas, chamado de contraturno.
Em Gratavaí, apenas dez das 46 escolas municipais seguem incluídas no programa. As outras, que melhoraram a avaliação, perderam as atividades. Ou seja, 4,3 mil dos 5.014 estudantes ficaram sem contraturno. Uma das escolas afetadas pela alteração nos critérios foi a Escola Municipal de Ensino Fundamental Professor Idelcy Silveira Pereira, no bairro Morada Gaúcha, considerada modelo na cidade, que deixou de oferecer oficinas a 200 alunos.
Para recordar as aulas de música do Mais Educação, a aluna do quinto ano Ana Caroline Raupp, dez anos, guardou a flauta doce e as partituras usadas para aprender as primeiras músicas. Segundo a mãe dela, a dona de casa Adriana Raupp, 38 anos, a menina ainda lamenta o fim das atividades extras.
Com o encerramento do contraturno, Adriana deixou o emprego de recepcionista para cuidar da filha em casa.
– Todos os dias, ela reclama de não ter mais aulas. Foi na escola que ela conheceu a flauta e já sonhava aprender a tocar outros instrumentos musicais. É, realmente, uma pena punirem as crianças que conseguiram aumentar as notas na escola – reclama Adriana.