A mais tradicional via de Porto Alegre sofre com falta de conservação, invasão de camelôs e promessas que não avançam.
A deterioração da Rua da Praia se agravou nos últimos anos com a retomada das calçadas pelos vendedores ambulantes e por problemas de infraestrutura como falhas no pavimento. A situação motiva frequentadores e comerciantes a exigir e propor soluções ao poder público para revitalizar a área.
A decadência da Rua dos Andradas, seu nome oficial, foi tema de um texto do colunista David Coimbra nesta segunda-feira (4). A constatação de desleixo com o antigo cartão-postal é confirmada por quem circula pela região. O corretor de grãos Mário Fonseca, 80 anos, lamenta o destino do local que começou a frequentar há quase sete décadas.
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Ainda criança, Fonseca cruzava a Galeria Chaves diariamente para buscar pão para a avó e, com o troco, comprar revistinhas. Mais velho, jamais deixou de perambular pela Andradas.
– A gente vinha conversar, olhar as moças bonitas. Olha como está isso hoje, uma esculhambação. Já me roubaram dois celulares, então agora uso esse aparelho para andar aqui – conta o corretor, mostrando um velho modelo de celular.
A volta do comércio informal, problema que havia sido resolvido com a inauguração do PopCenter em 2009, é apenas um dos atuais desafios. Com um projeto de revitalização urbana engavetado há quase dois anos, o piso e o sistema de iluminação se deterioram. Perto da esquina com a General Câmara, o pavimento se desfez e restou um buraco com algumas pedras soltas em seu interior. Os postes, velhos, reforçam a impressão geral de descuido.
– Não se via loja vazia na Rua da Praia. Hoje, há espaços à venda ou para alugar. A situação do Centro, somada à crise, assusta alguns investidores – analisa o assessor imobiliário Renan Wagner.
O projeto de revitalização, elaborado pelo município em parceria com entidades como o Sindilojas, deveria ter sido licitado em novembro de 2015, mas até hoje permanece como promessa. Segundo o ex-prefeito José Fortunati, faltaria apenas concluir o projeto executivo para tocar a obra, já que R$ 10 milhões para a reforma estariam garantidos por um financiamento. A iniciativa prevê a troca do pavimento e a substituição da infraestrutura com uso de fiação subterrânea.
Procurada por ZH, a assessoria de comunicação da prefeitura informou que o projeto de revitalização da Rua da Praia está em análise. Pedidos de entrevista com o prefeito Nelson Marchezan e com o secretário de Planejamento e Gestão, José Parode, não foram atendidos. Parode informou, via assessoria, que poderia se manifestar sobre o assunto na terça-feira.
Mas nem tudo é desesperança no Centro: investimentos recentes como a reforma da Galeria Chaves e a inauguração da loja Lebes Life Store mostram que a velha Rua da Praia mantém o potencial.
– Temos de ter cuidado com o saudosismo, mas é possível, sim, qualificar a Rua da Praia. Aumentar o espaço para os pedestres, investir em iniciativas como parklets, melhorar o mobiliário urbano transformaria um espaço de trânsito em um espaço de permanência – avalia o presidente da seccional gaúcha do Instituto de Arquitetos do Brasil, Rafael Passos.
Alguns dos pontos negativos da via mais famosa da Capital:
Camelôs – Praticamente extintos da área central desde a inauguração do PopCenter, em 2009, quando o centro de compras recebeu os ambulantes, os camelôs voltaram a ocupar as vias nos últimos dois anos. A Rua da Praia é um dos pontos preferenciais para a venda de bugigangas como eletrônicos, brinquedos, roupas, relógios e outros itens.
Pavimento – Em vários pontos, o calçamento da Rua da Praia apresenta irregularidades e falta de lajotas. Um dos trechos mais críticos é nas proximidades da esquina com a General Câmara – ali, há um ponto em que o pavimento deu lugar a um buraco e a pequenas pedras soltas.
Contêineres – Em pontos nobres da Rua da Praia, como nas imediações da Praça da Alfândega, os passantes dividem espaço com contêineres de lixo colocados no meio do passeio público. Alguns receberam pinturas coloridas para tentar amenizar o impacto visual.
Pichação – Ao longo da via e no seu entorno são frequentes as pichações, que atingem fachadas de prédios, lixeiras, monumentos (como no caso da Praça da Alfândega) e outras superfícies. As pichações ampliam a impressão de abandono e desleixo com a região.
Lixeiras – Muitas lixeiras estão em más condições de conservação, com corrosão do metal. Perto da esquina com a General Câmara, foi colocado um saco plástico sob a lixeira a fim de evitar que os materiais descartados ali caiam diretamente sobre a calçada.
Segurança – Muitos frequentadores se queixam da sensação de insegurança ao circular pela Rua da Praia. Essa sensação aumenta à noite, quando diminui o número de pessoas circulando e também há queixas sobre insuficiência do sistema de iluminação.
INICIATIVAS QUE NÃO SAÍRAM DO PAPEL
Bonde: em janeiro de 2005, ZH publicou reportagem sobre um projeto que seria retomado pela Trensurb, levando o antigo bonde ao centro da Capital. O trajeto já estava definido: a linha sairia do Largo Glênio Peres, passaria pela Rua da Praia e chegaria ao Gasômetro. A iniciativa fazia parte do projeto de revitalização do Centro Histórico. De acordo com a Trensurb, a proposta foi entregue à prefeitura, mas acabou não saindo do papel.
Edifício Imperial: em 2006, reportagem de ZH mostrou parceria entre a prefeitura e a Caixa Econômica Federal para inaugurar o Conjunto Cultural Caixa no prédio do antigo Cinema Imperial. O projeto, na época, contemplava cine-teatro com 650 lugares, área de exposições, museu, sala multimídia, cafeteria e revistaria. A estimativa é de que fosse inaugurado em 2010. A obra ainda não foi concluída, mas, recentemente, a Caixa informou que a previsão de abertura é para o segundo semestre de 2018.